quarta-feira, 17 de outubro de 2018

sobre o exílio

Nesse pequeno livro estão enfeixados três ensaios curtos de Joseph Brodsky, o poeta russo que recebeu o prêmio Nobel de Literatura de 1987. Já conhecia os três ensaios (já registrei aqui minhas impressões sobre o bom "On grief and reason"), mas sempre é bom reler cousas bem escritas. "A condição chamada exílio" foi produzido originalmente para uma conferencia sobre exilados em Viena, no final de 1988. "Uma face incomum" corresponde ao discurso de aceitação do prêmio Nobel, pronunciado na cerimônia de entrega dos prêmios em Stockholm, em dezembro de 1987. O último, um tanto menor, corresponde ao dito "discurso do banquete", pronunciado em um almoço na prefeitura de Stockholm, menos formal, solene, e que antecede a cerimônia noturna de entrega dos prêmios. Os três ensaios podem ser encontrados em inglês, ou no site da Fundação Nobel (Discurso de aceitação; Discurso do banquete), ou no site da The New York Review of Books (Exílio). Pois é a questão do exílio que paira perene nos três ensaios, nos três discursos. São ponderações de um sujeito que não apenas sabe se expressar com muita exuberância e clareza, mas de alguém que experimentou o cárcere e o isolamento por muitos anos antes de finalmente alcançar a liberdade e a condição de exilado. Não se trata portanto de abstrações conceituais. O sujeito sabe muito bem sobre o que está falando. Há gratidão nas palavras de Brodsky, aos que o convidam e aos que o premiam, e a seus predecessores, aqueles que reconhece como poetas fortes (Osip Mandelstam, Marina Tsvetaeva, Robert Frost, Anna Akhmátova e Wystan Auden), mas também um sarcasmo silente. Não me cabe aqui sintetizar os muitos e convincentes argumentos de Brodsky, que sabe bem conduzir o leitor / ouvinte ao entendimento de temas complexos, controversos até. Os temas que mais me impressionaram foram sua defesa da particularidade de cada condição humana, seu louvor da relação sem intermediários entre a arte e os indivíduos, da precedência da estética sobre a ética, do cuidado que se deve ter com arautos, com aqueles que se arvoram no direito de interpretar a realidade para os demais, da força inevitável da linguagem, dos inaceitáveis sacrifícios humanos que as doutrinas totalitárias cobram ao tentar alcançar um triunfo e concretizar promessas que nunca se realizam. Nesse bizarros tempos, imagino que só mesmo a hipocrisia ou o Alzheimer moral explicam como legiões de escravos mentais se negam a aceitar o fracasso das ideologias de esquerda e que, eventualmente, querem, num anacronismo perverso, implantar nestes trópicos. Não vale a pena perder tempo com isso. Vamos em frente. Evoé Brodsky, evoé. Vale! 
Registro #1339 (crônicas e ensaios #234) 
[início 12/10/2018 - fim: 16/10/2018] 
"Sobre o exílio", Joseph Brodsky, tradução de André Bezamat e Denise Bottmann, Belo Horizonte: Editora Âyiné (coleção Biblioteca Antagonista #2), 1a. edição (2016), brochura 12x18 cm., 76 págs., ISBN: 978-85-92649-02-9 [edição original: "The condition we call exile" (New York: The New York Review of Books) 1988 / "Noblelevskaja Rec'" and Acceptance Speech "The Nobel prizes, editor Wilhelm Odelbert (Stockholm: Nobel Foundation) 1987]

Nenhum comentário: