domingo, 13 de abril de 2008

boris godunov

Umas das coisas que eu mais gostava quando pequeno era folhear os fascículos da "Enciclopédia Trópico" de meu pai. Um dia descobri em uma das malas que ficavam na parte de cima do guarda roupa do "quarto das meninas" vários dos fascículos que estavam faltando na coleção e isto foi motivo de felicidade e comemoração. Minhas primeiras noções de mitologia eu aprendi ali, folheando os verbetes coloridos mas, convenhamos, mal organizados da enciclopédia. Bom. Uma das histórias que eu lembro muito bem era aquela em que o falso Tsar russo Dimitri toma o lugar do Tsar Boris Godunov. Logo destronado tem seu corpo disparado de volta a sua Polônia natal por um canhão. Eu sempre me impressionava com a possibilidade de se vingar de alguém desta forma, lançando seus ossos à canhonaços. Com o tempo confundi e misturei esta história com a do Tsar Ivan, o terrível, dos filmes do Serguei Eisenstein, e também com minhas associações livres malucas de sempre. Mas eis que encontro este "Boris Godunov" em uma livraria portoalegrense, bem editado pela Globo, com direito a uma tradução direta do russo, notas bem interessantes, apêndices e um posfácio generoso do tradutor. O poeta Aleksandr Púchkin fez esta versão dos sucessos da época de Godunov uns 200 anos depois e teve problemas com a censura do Tsar de plantão (Alexandre I), também as voltas com suas próprias rebeliões. Não estou certo se a peça foi mesmo escrita para ser encenada, mas há uma ópera de Mussorgsky baseada no texto que é executada com freqüência. A história é mais ou menos aquela que eu lembrava: Boris Godunov é levado ao trono no final do século 16 por meio de uma assembléia popular após seu cunhado ser considerado inapto (nada de novo, nosostros brasileiros sabemos muito bem que nada é mais fácil e rápido que comprar consciências de uma população semi-analfabeta, mas esta é outra história). Godunov foi o primeiro Tsar que alcançou o trono desta forma. Após uns dez anos de reinado conturbado um impostor que afirma ser o filho assassinado daquele que seria o herdeiro natural ao trono surge em um mosteiro polonês e logo ganha apoio popular, insurgindo-se conta Godunov. Este pateticamente não consegue desmascarar o impostor e acuado pelos fatos, acusado de ter assassinado o verdadeiro Dimitri, morre e é logo substituído pelo impostor. Mas este último não consegue manter sua aura por muito tempo e logo é igualmente destronado (e lançado a balaços de volta a Polônia, como são brabos e definitivos estes Russos). Achei o texto um tanto difícil de acompanhar. As passagens são fragmentárias. Há dezenas de personagens. A história vai se desenvolvendo lentamente. Não há propriamente uma divisão em atos, mas no início da segunda metade eu já estava mais ou menos acostumando ao ritmo. A peça termina com a morte de Godunov, sua mulher e seu filho. Nos apêndices e nas notas aparece enfim a tal história dos tiros de canhão. Experiência boa, mas acho que está na hora de ler mais coisas deste gênero literário, talvez treinar um pouco mais o ouvido, tentar ler em voz alta, tentar pensar mais no texto e menos na memória do assunto abordado. Na verdade preciso um dia ler os russos (don Renato me emprestou volumes que eu teimo em não ler). O tempo está passando.
"Boris Godunov", Aleksandr S. Púchkin, tradução de Irineu Franco Perpétuo, editora Globo, 1a. edição (2007) brochura 14x21cm, 180 pág., ISBN: 978-85-250-4351-1

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