Trata-se de um risco calculado, mas há escritores que sabem ler exaustivamente outros escritores. Há inclusive alguns destes que sabem também produzir crítica literária boa. É este o caso do seminal escritor sul-africano J.M. Coetzee. Seus livros de ficção são sempre muito imaginativos e sua prosa boa de se ler. Nunca é demais recomendar "Desonra", "O mestre de são Petesburgo" e "Juventude", para apenas citar três. Igualmente bons são seus livros de ensaios, em geral publicados previamente em grandes revistas, como o New York Review of Books. Os ensaios coligidos neste "Inner workings" mostram uma grande erudição. São vinte e um ensaios, que tratam ora de um ou dois livros específicos, ora o conjunto da obra do escritor em questão. Entre citar todos e nenhum prefiro a primeira opção: ele fala de Italo Svevo, Robert Walser, Robert Musil, Walter Bejamim, Bruno Schulz, Joseph Roth, Sándor Márai, Paul Celan, Günter Grass, W.G. Sebald, Hugo Claus, Graham Greene, Samuel Beckett, Walt Whitman, William Faulkner, Saul Bellow, Arthur Miller, Philip Roth, Nadine gordimer, Gabriel García Márquez e V.S. Naipaul. Na introdução assinada por Derek Attridge estes autores são agrupados em quatro conjuntos, relacionados basicamente com as origens de cada escritor, a forma com que cada um explora sua história pessoal ou as atribulações pelas quais eles e seus países passaram durante as grandes guerras da primeira metade do século passado. Attridge identifica também um conjunto de escritores que sem serem exatamente de grandes centros literários encontraram sua voz e seus leitores por todo o mundo (como o próprio Coetzee, afinal de contas). Talvez estas classificaçôes sejam técnicas e irrelevantes demais. Os ensaios sabem se defender sozinhos. Falam de uma literatura consistente, de autores bastante respeitados. Um terço deles ganharam o prêmio Nobel (como ele mesmo, cabe dizer). Ele sabe localizar os débitos literários de cada escritor e apresentar as boas soluções ou mesmo erros em cada um dos livros que comenta. Uma preocupação que ele sempre explicita envolve o problema das traduções, da recepção de cada autor para públicos que não dominam a língua original em que os textos foram escritos. Cada ensaio termina com uma lista extensa de notas e referências. Li aos poucos e o carreguei várias vezes de um lado ao outro, mas ao final aprendi um bocado com este livro. [início 13/07/2009 - fim 18/09/2009]
"Inner workings - essays 2000-2005", J.M. Coetzee, Vintage books (1a. edição) 2008, brochura 12,5x20, 304 págs., ISBN: 978-0-099-50614-0
Rapaz, que prazer cair por acaso em seu blog!
ResponderExcluirTornar-me-ei um leitor assíduo.
Se te interessar, tenho aqui uma resenha sobre Mecanismos Internos:
http://charllescampos.blogspot.com/2011/03/mecanismos-internos-de-j-m-coetzee.html
Abraços.