quinta-feira, 2 de junho de 2011

nemesis

Comprar edições em capa-dura é um mimo que faz bem a alma. Consolamos o Scrooge que late dentro de nós lembrando que o papel é melhor e menos ácido, que as costuras são bem acabadas, que a sobrecapa irá proteger melhor o livro. Encontrei este "Nemesis" em uma daquelas excursões aos jardins de cimento dos Campos de Piratininga (quem está cansado de São Paulo está cansado da vida). Para os gregos Nêmesis era a força contraposta à soberba dos homens, a força inevitável que pune aqueles que ultrapassam uma certa medida (o duro é descobrir esta justa medida). Para Philip Roth Nêmesis é o grande tema que une suas últimas histórias (Homem Comum, Indignação, A humilhação, Nêmesis). Não há Kepeshs, Roths ou Zuckermans em "Nemesis", uma novela curta (mas com enredo denso), que se resolve em três breves passagens. O tema parece ser mesmo a morte e o acaso da vida. Ele fala principalmente de como as decisões que tomamos pouca influência têm no fluxo natural das coisas, já que a vida é mesmo um sopro. No caso de "Nemesis" o narrador é Arnie Mesnikoff, nas duas primeiras partes do livro ainda um garoto, na terceira já um senhor de meia idade. É Arnie quem conta a história dramática do personagem principal, Eugene Cantor, um jovem professor de educação física. No verão de 1944 Cantor dá aulas de recreação em um parque público da periferia de Newark (New Jersey), onde vivem majoritariamente judeus. Ele não foi convocado para a guerra pois tem um problema bobo nos olhos, mas é um excelente atleta e incentiva seus alunos a tornarem-se bons atletas também eles. Sua namorada, também uma jovem professora, mudou-se para a região das montanhas Pocono (na Pennsylvania). Ela tenta convencê-lo a aceitar um posto de professor na mesma escola (ou acampamento de verão, não estou certo) em que ela está trabalhando. Como quase sempre nos livros de Philip Roth, ele apresenta uma situação mais ou menos ideal, previsível e logo coloca seus personagens narradores para falar e destrinchar o que há de podre nela. Em "Nemesis" é uma epidemia de poliomelite (uma doença incurável até meados dos anos 1950). Seus alunos do parque público começam a contrair a doença. O pânico por conta das primeiras mortes, principalmente pelo contraste com as mortes nos combates na Europa, é imenso. Sua garota tenta convencê-lo a aceitar a posição no acampamento da Pennsylvania (tanto por medo da doença, quanto pelo desejo de ficar perto dele e casar-se). Todavia Cantor fica dividido moralmente, pois acredita ser seu dever permanecer ao lado de seus alunos (que continuam ficando doentes e morrendo). Ele se pergunta se não há uma deidade que velaria pela segurança e felicidade dos homens. Roth sustenta este dilema por todo o livro. O leitor realmente partilha algo deste dilema. Há mais, claro, Philip Roth nunca se contenta em apresentar apenas um problema moral para seus leitores ideais, mas se eu continuar daqui a graça do livro se perde. O velho urso de Connecticut parece não ter mais fôlego para histórias longas, mas ainda sabe surpreender um leitor. Bom livro. [início 09/05/2011 - fim 26/05/2011]
"Nemesis", Philip Roth, New York: Hougton Mifflin Harcourt, 1a. edição (2010), capa-dura 13,5x20 cm, 280 págs. ISBN: 978-0-547-31835-6

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