terça-feira, 19 de setembro de 2017

descendo a rua da bahia

Uma de minhas maiores alegrias como caçador de livros em sebos aconteceu em meados dos anos 1980, quando encontrei um exemplar de "Chão-de-Ferro", do Pedro Nava, volume raríssimo naquela época. Aprendi um bocado com seus livros de memórias ("Baú de Ossos", "Balão Cativo", "Chão-de-Ferro", "Beira-Mar", "Galo-das-Trevas", "O Círio Perfeito" e o incompleto e póstumo "Cera das almas") e também nos muito livros que foram escritos sobre ele. Esse "Descendo a rua da Bahia" reúne a correspondência entre Nava e Carlos Drummond de Andrade, cujas poesias sempre li pouco, ai de mim. São 63 documentos, manuscritos e datilografados, a maioria cartas, mas também cartões postais, recortes de jornal, telegramas. A edição é uma beleza. Uma miríade de ilustrações enfeita o livro, reunindo fotografias, reproduções de manuscritos, crônicas publicadas em jornais e revistas, poemas elegíacos, capas de livros, cópias de bilhetes. O leitor até esquece que há textos no livro, que também são belíssimas as cartas e os mimos que trocam entre si, que são os textos que contam algo melhor a genuína amizade que durou mais de sessenta anos, amizade iniciada em um longínquo fevereiro de 1922, em um bar em Belo Horizonte frequentado por jovens intelectuais e maio de 1984, quando Nava decide se matar. Eram dois sujeitos quase da mesma idade esses mineiros que tornaram-se cariocas, Carlos Drummond era uns poucos meses mais velho que o Nava. Além de duas breves apresentações assinadas pelas organizadoras do livros, as especialistas Matildes Demetrio dos Santos e Eliane Vasconcellos, o livro inclui um posfácio generoso de Humberto Werneck e, num apêndice, poemas e crônicas escritas por Drummond após a morte de Nava, onde ele canta a saudade do amigo ausente e exalta sua obra. Que belo livro. Lendo algo sobre o Nava e a amizade lembrei-me, claro, da Misa, para quem dei de presente aquele raro volume do "Chão-de-Ferro" encontrado num sebo. Logo depois ela se separou do Péricles e se afastou dos amigos dele, como eu, que perdi a amiga e as conversas sobre Proust, Hilda Hilst e, quase sempre, o Nava, mas essa é outra história. 
Registro #1217 (cartas #7)
[início: 04/09/2017 - fim: 12/09/2017]
"Descendo a rua da Bahia: A correspondência entre Pedro Nava e Carlos Drummond de Andrade", Eliane Vasconcellos e Matildes Demetrio dos Santos (organização e notas), São Paulo: Bazar do Tempo, 1a. edição (2017), brochura 14x21 cm., 240 págs., ISBN: 978-85-69924-24-1

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