Camille Paglia nos oferece neste "Imagens cintilantes" reflexões sobre arte. Trata-se uma proposta ambígua, ao mesmo tempo é confessadamente modesta ao tentar apresentar através de vinte e quatro reproduções fotográficas a história e os estilos da arte ocidental, contudo tem a enorme ambição de restaurar nossa capacidade de ver. A linguagem utilizada por ela tenta alcançar um público amplo, leigo, não familiarizado com o jargão utilizado tanto por artistas plásticos quanto acadêmicos. Ela justifica sua proposta argumentando inicialmente que neste início de século XXI nossos olhos estão inundados por um mar de imagens que mesmo o mais obstinado dos sujeitos jamais será capaz de registrar e processar. A esta miríade de dados acrescenta que a multiplicidade de estilos e formas de expressão artística não permite mais que uma pessoa, mesmo a mais educada, possa afirmar rapidamente o quê dentre aquilo que vê na produção artística contemporânea permanecerá e terá algum valor estético para as futuras gerações de homo sapiens sapiens. Argumenta também que a arte como fenômeno social jamais foi tão irrelevante e menosprezada. Como acadêmica militante (ela é uma respeitada professora da The University of the Arts) advoga que os estudos culturais relacionados à arte estão excessivamente contaminados por abordagens marxistas, abordagens que são incapazes de separar arte de ideologia, significado econômico ou político. Ela entende a expressão e a fruição artística como processos essencialmente libertários, que dão a cada indivíduo o entendimento do todo humano, de toda história da civilização, de todas as sutilezas de sua psique. As vinte e quatro imagens que usa para exemplificar ao leitor o desenvolvimento dos estilos de arte ocidental são arbitrárias, claro que milhares de outras também serviriam para o mesmo propósito. O que é importante em cada capítulo é sua argumentação, a forma com que desenvolve seus temas. Após algumas poucas imagens dedicadas as civilizações egípcia e grega (além de uma breve passagem pela arte religiosa, até o fim do primeiro milênio da era cristã) Paglia dedica-se aos estilos que floresceram nos últimos quinhentos anos, desde a escultura e pintura renascentista até a pop-art, a performance e o cinema. Em sua abordagem a arte mais expressiva e seminal sempre é aquela associada ou ao processo técnico mais moderno e eficiente de cada época ou ao entendimento mais preciso e aguçado, pelo artista, das transformações sociais pelas quais o homem passa a cada época. O artista sempre é ou o artesão mais refinado ou o "antena da raça" melhor preparado de seu tempo. Paglia fala também do quão enganadora pode ser a valorização da cultura de massas de nosso tempo e descreve como a manipulação digital e instantânea da realidade pode modificar para sempre nosso legado cultural. "Imagens cintilantes" é um livro de arte para quem gosta de ler sobre arte e, melhor ainda, faz o leitor pensar em consultar um livro de reproduções que tiver à mão, visitar o museu mais próximo, vagar pela cidade a exercitar o olhar por tudo o quê há de humano impresso nela. Não é pouco.
[início: 01/12/2014 - fim: 19/12/2014]
"Imagens cintilantes: Uma viagem através da arte desde o Egito a Star Wars", Camille Paglia, tradução de Roberto Leal Ferreira, Rio de Janeiro: editora Apicuri, 1a. edição (2014), capa-dura 19x24 cm., 224 págs., ISBN: 978-85-8317-017-4 [edição original: Glittering Images - A journey through art from Egypt to Star Wars (New York: Vintage / Knopf Doubleday Publishing Group - Random House) 2013]
Bela sugestão de leitura, Dom Guina. Não conhecia esse lado de reflexões da Senhora Paglia. Obrigado!
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