"A forma da sombra" é antes um romance fantástico que um romance policial, como a ficha catalográfica sugere. Um sujeito que se entende como uma nova espécie de ser vivo experimenta uma metamorfose que o faz preferir escuridão a luz, o obriga a alimentar-se de carne humana, confunde seus pensamentos e a cronologia de seus atos. A narrativa nos faz entender que fisicamente o sujeito sempre foi diferente e inapto ao convívio social, mas é ao longo dela que ele ganha a consciência dessa inaptidão (que o leva progressivamente a terríveis conseqüências). Fernando de Abreu Barreto, um jovem advogado carioca, ambienta esse seu romance de estréia num Rio de Janeiro cinza e escuro, onde não há tempo para amabilidades, gentilezas, tempo para desfrutar das belezas naturais, da vida e do sol. O narrador percorre os túneis do metrô carioca como um vampiro moderno, é sagaz e manipulador, auto-centrado e gradualmente mais faminto. As digressões do narrador incluem reflexões filosóficas e sociológicas, bem próprias de nosso tempo. De qualquer forma, como se trata de uma alegoria, o leitor logo entende que ainda mais brutais que o sujeito que se imagina não pertencer a espécie humana são seus vizinhos, seus colegas de trabalho, seu chefe, estão as pessoas que encontra nos bares e o detetive que é escalado para persegui-lo. Viver é muito perigoso e infinitas são as estratégias mentais que criamos para suportar esses perigosos. Ojo, vamos a ver o que Fernando de Abreu Barreto irá inventar no futuro. Vale.
[início: 11/03/2015 - fim: 13/03/2015]
"A forma da sombra", Fernando de Abreu Barreto, Campo Grande / Mato Grosso do Sul: Caligo editora, 1a. edição (2014), 15,5x22,5 cm., 116 págs., ISBN: 978-85-6700-605-5
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