Neste volume encontramos 24 textos aparentados entre si, mas de vocações diferentes. Claro, todos eles tratam de Elizabeth Bishop (1911-1979), poeta americana muito premiada que viveu anos no Brasil (de 1952 a 1967). Publicados originalmente em jornais ou revistas (o mais antigo em 1950 e o mais recente em 1986) os textos pertencem a pelo menos três categorias diferentes: um quarto delas estão editadas como entrevistas transcritas; um outro quarto corresponde a reportagens longas ou ensaios onde o autor reproduz integralmente trechos de entrevistas que fez com Bishop e os conecta através de curtos comentários pessoais; a metade restante corresponde também a narrativas jornalísticas, mas o tom é mais convencional, os autores descrevem suas impressões sobre entrevistas (no caso de jornalistas) ou períodos de convivência (no caso de ex-alunos dela). Para meu gosto o primeiro conjunto é de longe o mais interessante, pois há muito menos interferência ou filtro autoral neles que nos demais (apesar de um dos relatos de ex-alunos, o último editado no livro e publicado originalmente na revista New Yorker, ser o texto mais poderoso). Os textos são naturalmente repetitivos, um tanto pelo confessado avesso de Bishop a conceder entrevistas, outro tanto simplesmente porque tudo o quê há de factual e interessante na vida e na obra da maioria das pessoas se concentra em torno de uns poucos assuntos (talvez aqueles produzidos em quinze minutos de fama, como já disse Andy Warhol). De qualquer forma, para o leitor que não conhece nada sobre Bishop essa repetição acaba por familiarizá-lo com alguns detalhes sua vida: sua infância; suas viagens e influências literárias; sua carreira e prêmios; das amizades que louvava (com Marianne Moore, Robert Lowell, Randall Jarrell); dos anos vividos no Brasil; de sua fama precoce; de sua experiência didática e suas manias. Espalhado pelo livro encontramos também algo sobre seu ofício: o quão importante lhe parecia o conhecimento de grego e latim para um poeta; da inutilidade dos cursos de escrita criativa das universidades; da estupidez de classificar homens e mulheres em categorias literárias distintas; das diferentes opções estéticas que oferecem os versos tradicionais e os versos livros. Lembro-me que assim como agora (já que um filme sobre sua vida e outros livros além deste "Conversas ..." foram publicados recentemente), em algum momento do final dos anos 1980 Elizabeth Bishop também era muito citada nos jornais (não sei mais o motivo: um livro dela que havia sido publicado naqueles dias?, algum detalhe de sua vida amorosa em seus anos de Brasil havia sido descoberto?, sabe-se lá). O livro de poemas dela que tenho (uma edição da Companhia das Letras de 1990, acho que era parte de uma coleção muito boa, que incluía Wystan Auden, William Carlos Williams, Wallace Stevens) está muito pouco rabiscado. Será que cheguei mesmo a lê-lo? Ou era eu apenas mais zeloso dos livros do que sou agora? Não me lembro de nenhum dos poemas daquele volume. Talvez o certo seja sempre procurar ler a obra de um autor, procurar sempre esquecer ou parar de bisbilhotar sua vida, mas somos homo sapiens sapiens, ai de nós, e adoramos encontrar na vida de nossos semelhantes, principalmente aqueles caros às Musas, a justificação para aquilo que sua obra nos oferece tão naturalmente. Vamos em frente.
[início: 21/08/2013 - fim: 19/09/2013]
"Conversas com Elizabeth Bishop", George Monteiro (organizador), tradução de Amanda Guizzo Zampieri, Carolina Barcellos, Cláudia Santarosa, Heci Regina Candiani, Rogério Bettoni (organizador da tradução), Belo Horizonte: editora Autêntica, 1a. edição (2013), brochura 15,5x22,5 cm., 189 págs., ISBN: 978-85-8217-201-8 [edição original: Conversations with Elizabeth Bishop (Mississippi: University Press of Mississippi) 1996]