Nunca havia lido um livro de Altair Martins, mas o Zeca Poli, livreiro portoalegrense e amigo dos bons me garantiu que o garoto (Altair tem uns 33 anos) vale ouro, seu livro de contos "Como se moesse ferro" sendo realmente muito bom. Infelizmente não conseguimos uma dedicatória no exemplar que compramos, pois a fila na Feira do livro de Porto Alegre estava enorme demais para nosso humor. Deixei este "A parede no escuro" na pilha das cousas por ler e eis que neste começo de ano consegui engatar a leitura das primeiras páginas e seguir em frente. É de fato um livro bem escrito, o sujeito sabe manter o ritmo e ir amarrando os caminhos dos personagens. A maioria dos personagens é gente simples (padeiro, professores, aluna de veterinária, aposentados). Vez ou outra encontrei uns termos estranhos, mas um par de conversas com amigos gaúchos legítimos resolveu a maioria (como bacia de "matéria" e provas "preventivas e terapêuticas") mas "dorninho" eu ainda não sei o que é. Paciência. A historia envolve vários estágios de culpa: um sujeito atropela e mata um padeiro quase vizinho da casa de seu pai em uma manhã chuvosa. Foge do local e depois passa a se preocupar se o pai chegou a vê-lo naquela manhã (pois o pai saiu de casa para averiguar o sinistro). Há várias tramas paralelas, envolvendo sempre os mesmos personagens: o sujeito que atropelou o padeiro é professor e se envolve com uma aluna que divide um apartamento com uma menina que é também vizinha do padeiro morto; o pai do sujeito e o padeiro morto mantiveram uma rivalidade por anos e chegaram a tentar se matar; quando jovem o sujeito ajudava o pai a matar gatos com requintes de crueldade; a filha do padeiro morto é uma jovem aluna de veterinária que não tem o sangue frio necessário para exercer a profissão, acaba assumindo o lugar do pai no balcão da padaria; a mulher do padeiro morto é um tanto simplória e distante, mal expressa sua perplexidade e dor; o próprio atropelador tenta ir a delegacia confessar seu crime, mas a burocracia policial praticamente o absolve sem se interessar em ouví-lo. Estas tramas se enredam e de fato tudo é bem arrumadinho, mas arrumadinho demais para o meu gosto. Altair nos mostra um punhado de vidas miseráveis, um mundo cruel e patético, mas nada estranho para quem já a se acostumou a ler a alma humana sem hipocrisias, nestes tempos bicudos. A dúvida do sujeito em saber se o pai soube ou não de seu crime antes de entrevar-se em um leito de hospital é frágil demais para sustentar o desfecho do livro (ao menos para mim). Vou tentar o livro de contos do Altair um outro dia. [início 07/01/2009 - fim 17/01/2009]
"A parede no escuro", Altair Martins, editora Record (1a. edição) 2008, brochura 14x21, 253 págs. ISBN: 978-85-01-08055-4