Com "Insolitudes" Tiago Feijó venceu o premio Ideal Clube de Literatura de 2014. São nove contos curtos, bastante engenhosos, produção de alguém que é jovem, mas tem domínio das boas técnicas de sua arte. Três dos contos são mais explicitamente metaliterários, falam do mundo dos livros; os outros seis são menos brincalhões com a literatura, exploram certos espantos da vida. Todas as narrativas compartilham aquilo que o título promete: algo de insólito, bizarro, deslocado, ou no tempo, ou no espaço. Em "A insólita morte de Ernesto Néstor", Feijó inverte um aforismo de Nabokov que obriga os personagens a serem sempre escravos do autor e faz seu narrador ser dominado e eventualmente eliminado por um personagem; em "Josés" um sujeito recebe o fantasma de José Saramago e alcança escrever um livro em nome dele, num transe ; "Conto tirado de um poema" dá conta de um sujeito que é rechaçado pela namorada e decide tornar seu suicídio um acontecimento literário, coreografando, encenando, seu aborrecimento e morte; "O olho" é uma história que deve algo a Kafka ou Borges, no qual um olho surge em uma parede e, ao se expandir, deixa obcecado o morador daquele ambiente; "O caso do cartão" brinca com os sucessos retrospectivos de uma paixão vivida por um rapaz por uma garota que havia o abandonado; "Aqui, dentro de mim" trata dos ritos do luto de uma mulher que perde filho e nora para os elementos, o mundo natural; em "Uma noite na vida do sr. Lameque" uma mãe, talvez inebriada pelo Alzheimer, recrimina o filho que vela por ela pela morte de um outro filho, seu gêmeo ou irmão mais velho, num remoto acidente; " Há uma gota de orvalho em cada criança" descreve uma cena que adultos tratariam com mundanidade, hipocrisia, mas que no mundo das crianças brota livre, sem amarras, sem engajamentos artificiais, como sempre deveria ser; "A morte e a pequena Ana" conta como uma menininha pensa o suicídio do pai, tentando interpretar o mundo e as pessoas que, por sua vez, não a imaginam ser capaz disto. Ojo, acho que é o caso de acompanhar o que o Feijó inventará no futuro. Vamos em frente. Vale!
Registro #1337 (contos #157) [início: 18/09/2018 - fim: 25/09/2018]
"Insolitudes", Tiago Feijó, Rio de Janeiro: Editora 7Letras, 1a. edição (2015), brochura 14x21 cm., 101
págs., ISBN: 978-85-421-0383-0