quarta-feira, 14 de novembro de 2007

campônios

Este livro é de uma brutalidade sem par. Acho que deveria dizer que é uma novela e não um romance, mas não tenho muita certeza da tecnicidade que permite esta separação entre estilos literários. "A Família de Pascual Duarte" tem pouco menos de 150 páginas e descreve a vida de um campones do interior profundo espanhol da primeira metade do século passado. A vida é tão dura e as circunstâncias impelem o personagem tão prontamente para sua desgraça particular que não podemos deixar de lembrar do mundo grego e das tragédias em série que engolfam deuses e heróis. O narrador da história é o próprio Pascual Duarte, que escreve algumas de suas lembranças na cela onde está esperando sua execução. Há algo que me lembrou o Guimarães Rosa, por conta do tom monocórdio com que o sujeito vai contando sua história, pouco modificando seu discurso mesmo na presença de algum eventual interlocutor. No final aparecem algumas cartas de outros personagens que auxiliam o leitor a entender algumas lacunas da história contada por Duarte. Este é um pequeno e poderoso livro, repleto de passagens memoráveis e cruéis, escrito como se o autor estivesse tomado por uma psicologia selvagem. Este é o livro de estréia de Camilo José Cela (que viria a se tornar um dos maiores escritores espanhóis do século passado e que ganhou o prêmio Nobel em1989). Foi escrito em 1942, discretamente publicado naqueles tempos bicudos da segunda guerra mundial, mas fez-se notar rapidamente e granjeou fama a seu autor. Curiosamente foi publicado no mesmo ano de "O Estrangeiro", de Albert Camus e têm muita semelhança com este outro intenso livro. Há destas coisas no mundo dos livros e dos escritores.
"A Família de Pascual Duarte", Camilo José Cela, tradução de Janer Cristaldo, editora Bertrand Brasil, 3a. edição (1995) ISBN: 85-286-0355-5

Nenhum comentário: