terça-feira, 9 de agosto de 2011

duas novelas

As duas novelas incluídas neste livro foram publicadas separadamente no início dos anos 1990, ambas pela editora Imago. "Efeito suspensório", de 1993, é a mais curta das duas, "Goldstein & Camargo", de 1994, a maior. São duas boas histórias, escritas por um autor que domina técnicas variadas de como construir quebra-cabeças literários, que alcançam alguma versossimilhança. O ritmo e o material utilizado por Bernardo Ajzenberg nas duas é distinto, mas ambas são urbanas, contemporâneas. Elas gravitam uma São Paulo surpreendentemente discreta, que poderia ser entendida como um dos personagens (como o coro de uma tragédia grega). São histórias que tratam do que poderíamos chamar de "talentos desperdiçados", sujeitos que não suportam a cota de aborrecimentos a que são submetidos e se vêem, progressivamente, em uma espiral de inadequações e pequenas tragédias. "Goldstein & Camargo" é uma história de advogados, um thriller psicológico. Um dos sócios de um escritório de sucesso resolve defender no tribunal um colega de juventude envolvido em um crime passional. O outro sócio tenta acompanhar as motivações tortas do colega e entendê-lo, mas Proust já nos ensinou que aquilo que partilhamos com um amigo, um familiar, um conhecido, quase sempre é ilusório e parcial, enganador e frágil. A memória também é uma construção. "Goldstein & Camargo" convence, é uma história poderosa. "Efeito suspensório" discute algo das estratégias mentais que utilizamos para fugir dos problemas realmente centrais de nossa vida. Fala também das ações equivocadas derivadas dessas estratégias. Na histórias um sujeito que trabalha como contador em uma fundação tem pretensões artísticas (relacionadas ao mundo do teatro) e é seduzido por uma espécie de Mefistófoles moderno (Jonas, um bom personagem de Ajzenberg) com o qual viaja mundo afora e se associa num empreendimento maluco (uma espécie de bar descolado, talvez a fachada de um negócio de lavagem de dinheiro ou cousa que o valha). O autor sabe ser cruel, mas não sentimos pena do sujeito que ele inventou (somos afinal feitos do mesmo material que ambos). Gostei mesmo das histórias. Vamos a ver se encontro algo mais de Ajzenberg em breve. [início 01/08/2011 - fim 09/08/2011]
"Duas novelas", Bernardo Ajzenberg, Rio de Janeiro: editora Rocco, 1a. edição (2011), brochura 14x21 cm, 220 págs. ISBN: 978-85-6325-2668-7

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