O tempo passa rapidamente. Falar como se vivia em meados dos anos 1970 parece algo remoto, inusitado, anacrônico. Marcelo Coelho registra em "Cine Bijou" suas memórias afetivas com o cinema, o teatro, com bares e boates, enfim, com a vida noturna de São Paulo daquela época. A ditadura militar ainda seguia violenta e terrível. Mas Coelho, um jovem estudante, com menos de vinte anos, pouco entende o quê de fato acontece na política. Ele passa a frequentar o Cine Bijou, ali na praça Roosevelt, um dos poucos lugares da cidade onde filmes de arte podiam ser encontrados. Dos filmes pouco entende, mas sabe que algum valor as histórias amalucadas e experimentais devem ter, já que eram tão cultuadas. Junto ao aprendizado com o cinema vem o aprendizado com a vida, as colegas de escola que se tornam amigas, os porquês de alguns professores serem perseguidos pela ditadura (enquanto outros não) tornam-se menos áridos, os códigos de sedução tornam-se mais visíveis (e óbvios). Eu, que morava longe, em são Bernardo do Campo, também fiz naquela época minhas caminhadas solitárias por aquelas quadras, algo curioso sobre aquele mundo tão diferente e inspirador (mas só fui entrar na Kilt muitos e muitos anos depois). É um registro de época (curto na verdade), mas também oferece alguma invenção e humor. As ilustrações incluídas no livro, de Caco Galhardo, são muito boas. Trata-se de um livro da coleção Ópera Urbana da Cosac Naify, dedicada ao público infanto-juvenil. Já li e/ou dei de presente o "A cidade dos deitados", de Heloisa Prieto, e "Av. Paulista", de Carla Caffé. Neles São Paulo é apresentada e contada sempre com generosidade, destacando o quão acolhedora, pujante e mágica ela sabe ser, apesar das toneladas de cimento e cinza, dos quilômetros de congestionamento e lágrimas, da miríade de agressões e sonhos baldados. Mas, afinal, haverá alguém que não se apaixone por São Paulo no momento mesmo em que a conheça? Duvido.
[início - fim: 08/04/2013]
"Cine Bijou", Marcelo Coelho, ilustrações de Caco Galhardo, São Paulo: editora Cosac Naify (coleção Ópera Urbana), 1a. edição (2012), capa-dura 16,5x22,5 cm., 64 págs., ISBN: 978-85-405-0253-6
Um comentário:
Somos- o autor e eu - da mesma geração e os anos 70 foram de desvairio e utopias, preciso fazer esse inventário pessoal, um dua quem sabe. Um abraço, clara
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