"Dicionário amoroso do Recife" é o segundo volume desta simpática coleção. Os demais dicionários já publicados são dedicados a Porto Alegre de Altair Martins, a Curitiba de Marcio Renato dos Santos (ambos já resenhados por mim) e a Salvador de João Filho, que em breve incluirei nesse blog. Mas ao contrário de Porto Alegre e de Curitiba, cidades que conheço relativamente bem, nunca estive no Recife e pouco li sobre sua história ou seus habitantes. Sendo assim a experiência de ler esse dicionário foi um tanto mais intelectual e didática, um tanto mais distante e fria que as anteriores. De qualquer forma aprendi um bocado e fiquei com ganas de um dia vagar pela cidade como todo bom flâneur deve fazer. Urariano Mota, respeitado jornalista e escritor recifense, sabe conduzir o leitor por sua cidade e partilhar algo de seu encantamento por ela. Urariano é um tanto menos moço que seus colegas Altair Martins e Márcio Renato. Seus verbetes acusam terem sido decantados por mais tempo e mais experiência. Ao mesmo tempo que é informal e caloroso ao se dirigir ao leitor ele acrescenta com segurança pelo texto citações eruditas, coisas cifradas e não explícitas, de um frescor surpreendente. Frasista dos bons, sabe falar do passado sem ser piegas e reverenciar os sujeitos - famosos além das fronteiras de sua cidade ou não, pouco importa - que se identificam com a história de lá. Seus perfis, seja de pessoas ou lugares, são vibrantes, vívidos. Mas são as digressões, os diálogos e associações acrescentadas ao que há de factual nas histórias que tornam seu texto realmente forte. Trata-se mesmo de um bom cronista, que mescla o registro popular das historias que ouve pela cidade com o que há de mais refinado da literatura associada a ela. Os poetas e músicos merecem carinho especial dele. Muitas poesias e canções, principalmente marchas de Carnaval, estão transcritas no texto, povoando seu livro com outras vozes, memórias e sensações. Dois terços de seus 49 verbetes são dedicados a pessoas e não a geografia ou a história. O leitor acaba se interessando pelo ambiente, pelo povo, pelas coisas que já brotaram dali (e que talvez mal sabíamos, pobre de nós). A exemplo dos demais volumes dessa coleção, o livro inclui ilustrações, nesse caso assinadas por Leonardo Filho, um respeitado artista plástico paraibano radicado em Pernambuco. É certo, se um dia ao dobrar alguma esquina de meu coração e finalmente decidir-me em conhecer o Nordeste, será pelo Recife que começarei minha jornada. Veremos.
[início: 04/06/2014 - fim: 23/06/2014]
"Dicionário amoroso do Recife", Urariano Mota, Anajé/Bahia: Editora Casarão do Verbo, 1a. edição (2014), brochura 15x23 cm., 338 págs., ISBN: 978-85-61878-34-4