sexta-feira, 20 de novembro de 2020

você nunca chegará a nada

Dos muitos livros que tenho de Juan Benet só li Otoño en Madrid hacia 1950 e Trece fábulas y media y fábula decimocuarta. "Você nunca chegará a nada" é seu primeiro livro e foi publicado originalmente em 1961. São contos, quatro deles, mas são cousas densas e poderosas, que cobram tempo e atenção do leitor. Talvez os truques literários, o tom e as preocupações com o estilo (notadamente inspirados em Faulkner, se nota), ainda não explicitam o quão habilidoso Juan Benet tornar-se-ia, mas é o tipo de livro que faz a festa para o leitor exigente. No primeiro conto, que dá nome ao volume, "Você nunca chegará a nada", acompanhamos as andanças de quatro amigos espanhóis pela Europa, nos anos 1950, viagens de aprendizado e de espantos, de descobertas (sobretudo do provincianismo individual e coletivo, espanhol) e de reflexões. Nos três contos seguintes: 'Baalbec, uma mancha", "Luto" e "Depois", Benet situa suas histórias em uma região remota do interior profundo espanhol, uma região que ele inventa e chamará e evocará em muitos outros de seus livros, como Región (uma espécie de Yoknapatawpha faulkneriana, Macondo, de García Márquez ou Santa María, de Onetti). "Baalbec, uma mancha" trata da viagem que um velho senhor faz a uma pequena e degradada cidade (perto de Región) em que viveu na infância, para dar uma espécie de consultoria sobre uma questão fundiária (e ser confrontado com uma espécie de dívida), para um sujeito que comprou as terras que no passado foram de seu avô e demais parentes; "Luto" conta sobre as razões do hábito de um velho senhor de depositar flores no túmulo de uma mulher com quem pretendia se casar, mas que preferiu cuidar de uma tia amalucada e morreu ainda jovem; Em "Depois" os sucessos gravitam a morte de um velho senhor e da sucessão de seus negócios, que passam a ser administrados por um filho, também já idoso, e que vive encerrado em uma casa afastada. Não são histórias que se deixam ler sem esforço. Nelas, repetidas vezes ficamos sem saber quem está contando os fatos, de quem se fala, se trata-se de realidade ou sonho, memória ou desejo. Nos quatro contos sobressaem-se a decadência (física ou moral), os segredos (públicos ou privados), a memória (sempre cúmplice e traiçoeira), a sensação que já se viveu suficientes privações, mentiras ou contínuo autoengano. Vamos a ver se eu enfrento as grandes magnum opus de Benet: Volverás a Región, La otra casa de Mazón e Saúl ante Samuel. A ver. Sigamos o baile macabro. Vale!
Registro #1590 (contos #184)
[início: 09/06/2020 - fim: 30/10/2020] 
"Você nunca chegará a nada", Juan Benet, tradução de Maria Alzira Brum Lemos, Rio de Janeiro: Editora José, 1a. edição (2008, brochura 10x14, 250 págs, ISBN: 978-85-03-00906-5 [edição original: Nunca llegarás a nada (Madrid: Ediciones Tebas) 1961]

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