Estive em uma missão de trabalho no interior do Espírito Santo e achei por lá, por um feliz acaso, esse livro de Manoel Carlos Karam, de quem nunca havia lido nada. O volume chamou-me a atenção pois só há um par de meses eu havia tido notícia de Karam e de sua obra, informado pelo industrioso Marcio Renato dos Santos, imortal curitibano, jovem jornalista que conhece como poucos o mundo dos livros e da literatura deste país (o negócio dos livros e a arte da narrativa não são exatamente sinônimos). Em "Algum tempo depois" acompanhamos as reflexões de um homem que é uma espécie de espião industrial, um agente ou operador de uma empresa que oferece serviços sujos ao mercado. O romance me parece uma metáfora da vida vazia, da rotina e do tédio de que padecem, em qualquer tempo ou lugar, a maioria dos trabalhadores, no exercício de qualquer tipo de atividade. O narrador de Karam não tem nome, o leitor jamais saberá em que cidade ele vive, em que ano se sucedem os acasos da história. Esse narrador é obcecado por certos temas, repetitivo, incapaz de surpreender-se de fato com a vida. Os temas que lhe são caros são o tempo, os vinhos, a ideia de usar óculos, a seriedade de sua ocupação, os resultados esportivos, o silêncio, os sonhos, as variações de caminhos entre sua casa e seu escritório, as regras de sua atividade, a possibilidade do riso, as viagens de sua mulher (que é uma espécie de duplo seu, igualmente distante, enigmática, vazia). É um livro bem escrito, bem humorado, fácil de ler. Mas esse facilidade é cousa pensada, articulada, pois o leitor é continuamente provocado a conferir se não é uma espécie de espelho mágico aquilo que está a ler, se aquele tédio entranhado não é igual ao seu. Muito interessante. Vamos a ver se acho outras cousas dele para ler. Vale!
Registro #1329 (romance #350)
[início 28/08/2018 - fim: 11/09/2018] Registro #1329 (romance #350)
"Algum tempo depois", Manoel Carlos Karam, Curitiba: Arte e Letra Editora, 1a. edição (2014), brochura 13x19 cm., 176 págs.,
ISBN: 978-85-60499-61-8
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