quinta-feira, 26 de julho de 2012

o laçador de cães

Os editores da Grua optaram por identificar este pequeno livro de contos como "infanto juvenil brasileiro" (ao menos assim está grafado na ficha catalográfica). Deve haver alguma razão mercadológica para isso. Sabe-se lá qual. São quinze contos curtos (na verdade nove deles são curtíssimos, coisa de lauda, lauda e meia, quando muito). Luiz Andreoli faz uma espécie de censo das misérias do mundo e povoa seus contos com personagens sofridos e desesperados. Em alguns contos os narradores são sujeitos de classe média (um jornalista, um policial ou um médico) que descrevem a vida dura da gente pobre de sua cidade (Luiz é curitibano e suas histórias acontecem por lá). Noutros são os próprios deserdados que narram o sofrimento ou o infortúnio de que padecem. Algumas histórias são interessantes. Gostei de "Letrinha de professora, coração de bandido", em que um sujeito edita e glamuriza a vida de um preso, para provocar maior impacto em seu programa de rádio; e também do conto que dá nome ao livro, onde um sujeito se compadece de um cão e faz paralelos entre sua história e a do animal; assim como do conto "Eu faço samba e amor", no qual um policial, dublê de músico em bailes de carnaval, reflete sobre suas fugazes conquistas amorosas. É pouco. Os demais me pareceram mal resolvidos, fracos mesmo, coisas que abusam da pieguice e do sentimentalismo. Talvez as histórias tenham sido pensadas para funcionar como ferramenta de "edificação moral" de jovens leitores, afinal vivemos em um país onde as políticas governamentais mais que subestimam a inteligência alheia, mas, felizmente, os jovens leitores brasileiros de hoje (ao menos os que conheço) são cínicos demais para aceitarem histórias politicamente corretas e edificantes deste tipo. Paciência. [início 21/07/2012 - fim 25/07/2012]
"O laçador de cães", Luiz Andrioli, São Paulo: Grua livros, 1a. edição (2012), brochura 14x20 cm, 112 págs. ISBN: 978-85-61578-20-6

segunda-feira, 23 de julho de 2012

cujo

Foi don Marcelo Sahea, senhor de potentes poemas visuais, quem me falou com alegria sobre "Cujo", livro de estréia de Nuno Ramos no mundo da ficção. Nuno é um respeitado artista plástico, mas tem produzido curiosos livros de ensaios e de poemas em prosa, dele já resenhei aqui Junco, Ó e O mau vidraceiro. Fiquei de pedir a Sahea o empréstimo do livro, mas acabei por me açodar e encomendei-o de uma vez. É um texto difícil, mas que devolve ao leitor imagens, construções, aforismos e idéias muito interessantes. Nuno Ramos faz uma digressão poética da física dos materiais, da química de processos industriais, da biologia ou botânica do mundo vivo que cerca o homem, das metamorfoses entre o orgânico e o mineral. Ele parece falar sobre seu ofício, quando junta e transforma materiais para produzir arte e conceitos, mas ao descrever esta experiência ele nos apresenta um admirável mundo primevo, onde se desnuda a memória que nossos tecidos, sangue, fluidos e ossos têm de seu passado mineral. Inspirado pelo livro fiquei a pensar sobre muitas coisas: sobre a forma como coisas inanimadas se auto-organizaram, há milhões de anos; sobre como a beleza desabrocha do que está podre; sobre o fato do homem ser uma eterna criança que mal aprende, ou aprende mal, a entender as funções de seu corpo; sobre como apurar os sentidos para experimentar a interação da luz com a matéria. Divertido. [início 30/06/2012 - fim 22/07/2012]
"Cujo", Nuno Ramos, Rio de Janeiro: editora 34, 2a. edição (2011), brochura 12x18 cm, 88 págs. ISBN: 978-85-85490-14-0 [edição original: 1993]

quarta-feira, 18 de julho de 2012

café de artistas

Este pequeno livro chegou até mim pela gentileza de Daniela Santi, vindo lá das terras escarpadas de Aragón (mas ela o encontrou abandonado em uma das veraniegas calles de Madrid). Camilo José Cela é a prova que mesmo um sujeito canalha pode escrever bem e produzir uma obra literária respeitável (há quem duvide até disto, mas não sou exatamente um especialista nele, nem tenho procuração para defendê-lo, paciência). Em Café de artistas, publicado originalmente em 1953, Cela narra os dias de um jovem autor por um café madrilleño, desde os dias de juventude, provinciano, entusiasmado, sonhando com seus projetos literários, até os dias em que já é um "don", um dos velhos senhores do café, a avaliar com algum tédio a chegada de novos escritores. A história é plena de ironia e tudo é contado muito rapidamente, afinal se trata de um texto de sessenta e poucas páginas. O leitor prontamente vê-se no clima da narrativa de Cela, que expõe o que há de mais fundamental, mítico e entranhado na cultura espanhola (principalmente o conflitos geracionais, as transições entre tradição e modernidade). O protagonista de Cela tem vários nomes, talvez porque sejam indistinguíveis todos os efebos que tentam alcançar fama literária, partilhando seu comportamento e sonho, tateando por convenções sociais estranhas. Lê-se Café de artistas com alguma nostalgia. Algo me soa familiar, conhecido. Penso que talvez esta história fizesse parte do projeto original de seu La colmena e ele acabou descartando a idéia, pois o desvio perturbaria alguma coisa no ritmo de seu grande romance (que é de 1951). Talvez esta seja uma associação besta. Mas lembro-me de ter lido boa parte do La Colmena em cafés madrilleños, em meados dos anos 1980, também eu um rapaz de províncias a aprender algo na vetusta Europa. Talvez seja a hora de voltar àquelas páginas, voltar a Madrid, voltar a sonhar. Veremos. [início 14/07/2012 - fim 16/07/2012]

"Café de artistas", Camilo José Cela, Madrid: Alianza editorial (Alianza Cien), 1a. edição (1994), brochura 10x15 cm, 64 págs. ISBN: 84-206-4621-0 [edição original: Café de Artistas (La novela de sábado #6) Madrid, 1953]

sábado, 14 de julho de 2012

senhor proust

Encontrei este livro por acaso e que surpresa agradável, que festa para os sentidos e para a memória. "Senhor Proust" foi publicado em 1973 mas só traduzido para o português há poucos anos. Georges Belmont conseguiu o que muitos tentaram antes dele, entrevistar a mulher que acompanhou mais diretamente Marcel Proust em seus últimos oito anos de vida. Belmont entrevistou-a cinquenta anos após a morte de Proust, entrevistou uma senhora de oitenta e dois anos, ainda zelosa da memória de seu antigo patrão (e, claro, de sua própria reputação, como a jovem que velava tão atentamente toda a rotina de Proust). O resultado é surpreendente. O Proust que encontramos no livro é um sujeito tão cativante quanto seus personagens. Apesar das muitas camadas de tempo que filtram as memórias de Céleste sua versão parece verossímil (ao menos o suficiente para satisfazer o que um leitor dos livros Proust pode entender da relação dele com sua obra). A definição da personalidade de Proust que mais gostei no livro é aquela em que Céleste afirma ser ele um adivinhador de almas. Qualquer leitor que teve a fortuna de conhecer seus livros há de lembrar quão precisas e vívidas são as descrições dos personagens inventados por ele. As paixões humanas, as múltiplas e contraditórias facetas do comportamento humano, são admiravelmente dissecadas e expostas por Proust. Após ler seus livros parece mais fácil reconhecer nos vizinhos, nos colegas, nos amores, e sobretudo em nós mesmos, as virtudes e as hipocrisias próprias dos homens. Belmont dá voz a Céleste em trinta capítulos temáticos, mas há uma feliz uniformidade na narrativa, parece mesmo que estamos a ouvir um relato contínuo dela. Os capítulos dedicados aos hábitos (de alimentação, de toalete, de vida em sociedade) são os mais divertidos; aqueles dedicados as conversas entre eles sobre as relações entre os personagens de "Em busca do tempo perdido" e as pessoas que os inspiraram são os menos confiáveis; os capítulos onde se descreve a decadência física e a morte de Proust um tanto piegas demais para o meu gosto; aqueles onde ela dá voz ao Proust que se divertia em desnudar defeitos e falhas de caráter de seus editores, rivais literários ou mesmo amigos mais próximos, muito bons, examplares. Nada supera a experiência de ler os livros de Proust, mas livros como este dão ao leitor ferramentas de análise, instrumentos de associação, que justificam nosso desvio dos adoráveis caminhos da ficção. [início 29/06/2012 - fim 13/07/2012] 
"Senhor Proust: Céleste Albaret, lembranças recolhidas por Georges Belmont", Georges Belmont, tradução de Cordelia Magalhães, Osasco: editora Novo Mundo, 1a. edição (2008), brochura 16x23 cm, 446 págs. ISBN: 978-85-7679-152-2 [edição original: Monsieur Proust: Céleste Albaret, Souvenirs recueillis par Georges Belmont (Paris: Robert Laffont) 1973]

terça-feira, 10 de julho de 2012

o gato e o diabo

Este é um ano particularmente importante para quem se interessa pela obra de James Joyce. Além dos noventa anos da edição original do Ulysses (1922) e dos cento e trinta anos da data de nascimento de James Joyce (1882), comemoramos também o fato auspicioso de toda a obra dele estar agora em domínio público, setenta anos após sua morte (1941). Os herdeiros de Joyce eram extremamente zelosos de sua obra e dificultavam seu uso direto ou adaptado em qualquer tipo de manifestação artística e/ou cultural. A realidade jurídica de não haver mais direitos de copyright sobre a obra de Joyce é uma espécie de libertação e está sendo celebrada com alegria em todo o mundo. Também no Brasil muita coisa foi publicada. Além da muito aguardada tradução de Caetano Galindo do Ulysses (Penguin / Companhia das Letras), estão também nas prateleiras a primeira tradução para o português de Stephen Hero (Hedra), feita por José Roberto O'Shea (que também republicou uma antiga tradução sua do Dublinenses, Hedra) e a totalidade dos ensaios estéticos e políticos de Joyce, traduzidos por Sérgio Medeiros e Dirce Waltrick do Amarante (De santos e sábios, Iluminuras). Mas o livro de Joyce desta safra comemorativa mais bonito de se ver ou ler é um livro infantil, "O gato e o diabo". Trata-se de uma carta que Joyce enviou a seu neto Stephen em 1936 e que foi transformada em um livro ilustrado pela primeira vez em 1964. Esta carta/livro infantil já havia sido publicada no Brasil em 1980 (traduzido por Antônio Houaiss e reproduzindo as ilustrações da edição francesa, de 1978, produzidas por Roger Blanchon). Esta nova edição tem o padrão de qualidade da Cosac Naify. A tradução é assinada por Lygia Bojunga, respeitada escritora, principalmente por sua dedicação à literatura infantil (ela já ganhou o prestigiado prêmio Hans Christian Andersen). As ilustrações sáo de Lelis (Marcelo Eduardo Lelis de Oliveira), ilustrador e quadrinista mineiro. A história tem o frescor típico das coisas que os avós contam para entreter os netos. Mas claro, também o sarcasmo e erudição de Joyce estão ali, escondidos na narrativa. Este é o tipo de livro que faz leitores jovens e adultos passarem juntos bons momentos, de alegria e ilusão, como sempre deve ser. [início - fim 08/07/2012] 
"O gato e o diabo", James Joyce, tradução de Lygia Bojunga, ilustrações de Lelis, São Paulo: editora Cosac Naify, 1a. edição (2012), capa-dura 28,5x22 cm, 32 págs. ISBN: 978-85-7503-235-0 [edição original: The Cat and the Devil (Letters of James Joyce, edited by Stuart Gilbert) London: Faber and Faber, 1957]

segunda-feira, 9 de julho de 2012

outono transfigurado

Neste pequeno livro encontramos onze conjuntos de poemas e quatro narrativas curtas (ditas poemas em prosa) de Georg Trakl. Austríaco, Trakl nasceu no final do século XIX e suicidou-se muito jovem, aos 27 anos, no início da primeira grande guerra. A edição é bilíngue (mas o português de Portugal parece aumentar o estranhamento do leitor com os temas soturnos de Trakl). A compilação, tradução e um bom prefácio incluídos no livro são assinados por João Barrento. Os poemas são melancólicos, mas não piegas. Suas influências mais óbvias vem dos poetas simbolistas franceses, especialmente Rimbaud e Baudelaire. Aprendi no prefácio que Trakl teve uma vida atormentada por uma experiência incestuosa com a irmã e pela utilização de drogas pesadas como estímulo criativo, vivendo sempre obcecado com a morte. Lendo os poemas verificamos que quase sempre há um contraste entre opostos: luz e escuridão; contemplação e vivacidade; frio e calor. Encontramos também uma espécie de resgate de ritos pagãos, de culto a lua, ao sol, as florestas, as pedras e os rios. Os poemas em prosa são bem expressionistas, revelam a opinião de Trakl sobre o lado mais sombrio e terrível dos atos humanos. A edição inclui duas fotografias de Trakl, que parecem querer dialogar com o leitor. Na primeira Trakl está sentado, mãos cruzadas, olhando fixamente a cãmara fotográfica. Não parece incomodado, antes parece desafiar quem está a fotografá-lo. Já na segunda ele está em pé, usando uma farda, corte de cabelo militar, espada. Olha obliquamente a direção da fotografia. Uma de suas mãos está com o punho fechado, pronta para ser utilizada contra alguém. A outra mão está escorada no cinto, demonstrando um certo desdém com a situação. A obra de um sujeito sempre tem que se defender sozinha, mas estas duas fotos de Trakl tornam a experiência de ler seus poemas algo mais pessoal, diminuindo a angústia que sobra e vaza deles. Sigamos. [início 01/07/2012 - fim 03/07/2012]
"Outono transfigurado: Ciclos e poemas em prosa", Georg Trakl, tradução de João Barrento, Lisboa: editora Assírio & Alvim, 1a. edição (1992), brochura 13,5x20,5 cm, 113 págs. ISBN: 978-97-2370-297-2 [edição original: Dichtungen und Briefe, Walter Killy e Hans Szklenar (Otto Müller: Salzburg), 1969]

sábado, 7 de julho de 2012

a primeira pessoa

Apesar de ter comprado este livro com um certo entusiasmo, por conta de uma indicação confiável e por saber que o tradutor era o industrioso Caetano Galindo, eis que sua leitura me pareceu muito irregular. São doze contos curtos. Inegavelmente todos são bem escritos e originais, mas Ali Smith abusa de uns truques metaliterários e de situações auto-referentes que acabam por irritar o leitor (ao menos este velho e cansado leitor). Em uma das histórias uma criança faz as vezes da consciência algo culpada de um personagem; noutra um casal discute suas diferenças enquanto falam de Gershwin e Beethoven; num dos contos uma garota tenta esconder a vergonha que tem de sua mãe algo extravagante, quase louca; noutro é sobre a possibilidade banal de alguém ficar preso nos fundos de um cinema que um casal anima a conversação; o recebimento de um pacote enviado para o endereço errado gera uma discussão besta; o entendimento distinto do valor de uma música de Ella Fitzgerald outra; um porteiro trambiqueiro inventa historias para mitigar a culpa de seus patrões em uma noite de Natal; um rapaz doente faz com que sua mãe acredite em uma dupla de estelionatários; o protagonista de uma história discute decisões e escolhas de sua encarnação mais jovem; duas mulheres falam do que as aproximam e do que não gostam uma da outra; o narrador de uma história digressa sobre o poder da literatura (e sobre a força do uso da terceira pessoa num texto); uma mulher discute com outra uma teoria bizarra sobre as diferenças entre contos e romances que ouviu em um bar. A originalidade das histórias engana o leitor, assim como iludem em um circo ou a habilidade de um bom malabarista ou a rapidez de um mágico bem adestrado. Ao final nenhuma das situações criadas por Ali Smith parecem de fato decalcadas da realidade, pois acabam expondo cedo demais seu artificialismo, e servem apenas para entreter o leitor um par de horas. Lembrei várias vezes de uma frase de Bob Fosse no "All that Jazz": "treatral demais Joe!". Estarei sendo pouco indulgente? Talvez. Paciência. Talvez seja o caso de ler outras narrativas dela, experimentar outras propostas de sua prosa com mais calma e aí afirmar mais coisas sobre ela. Logo veremos, mas já é tempo. Sigamos pois. [início 12/06/2012 - fim 30/06/2012]
"A primeira pessoa e outros contos", Ali Smith, tradução de Caetano W. Galindo, São Paulo: editora Companhia das letras, 1a. edição (2012), brochura 14x21 cm, 148 págs. ISBN: 978-85-359-2074-1 [edição original: The first person and other stories (London: Hamish Hamilton / Penguin Group) 2008]

segunda-feira, 2 de julho de 2012

as entrevistas da paris review 2

Encontramos neste "As entrevistas da Paris Review - vol. 2" exatamente o que o título promete: uma (pequena) amostra das quase 350 seminais entrevistas já publicadas pela The Paris Review. Assim como no volume anterior, publicado em 2011, as escolhas aqui são aleatórias, certamente um capricho do editor, que faz suas apostas sobre quais nomes ainda têm ressonância no público leitor e algum valor literário caro aos críticos. A reputação literária é algo sempre fugaz e só uns poucos de fato vão sobreviver no apreço das futuras gerações (ao menos dos leitores não profissionais). As entrevistas mais antigas são dos anos 1960 (Arthur Miller e Vladimir Nabokov), as mais recentes dos anos 2000 (Hunter Thompson, Louis Begley e Salman Rushdie).  Encontramos também John Cheever e Joseph Brodsky (anos 1970), Tennessee Williams, Elizabeth Bishop, Julio Cortázar, Milan Kundera e Maguerite Yourcenar (anos 1980) e Martin Amis, um solitário representante dos anos 1990. Na verdade este registro não tem muito valor, pois foi o filtro original dos editores da The Paris Review quem gerou a ordem e a oportunidade das entrevistas, certamente movidos por miríades de conveniências cruzadas. Paciência. A entrevista com Elizabeth Bishop é curiosa, por conta de referências ao Brasil que obviamente não seriam tão neutras se conduzidas por uma jornalista brasileira; a de Joseph Brodsky é algo caótica, mas faz com que o leitor procure um livro ou poema dele para ler; Nabokov, que só respondeu por escrito, é controlador e duro nas respostas; Cortázar abusa na defesa de seu engajamento político; a de Milan Kundera boa, por conta do registro de suas preocupações teóricas e estéticas; Arthur Miller e Martin Amis são cerebrais demais, racionalizando tudo o que dizem; John Cheever parece desdenhar de seu próprio valor ou imanência literária; Marguerite Yourcenar contida e ambivalente demais; na de Salman Rushdie o leitor encontra um bom exemplo do quanto de acaso existe no ofício de escritor; Louis Begley revela ser zeloso demais com a reputação de seus personagens; a de Hunter Thompson (afinal, mais jornalista que bom escritor) uma egotrip dispensável. Algumas entrevistas refletem linearmente a conversação, noutras encontramos resumos temáticos do que foi abordado diretamente ou dirimido em contatos telefônicos, e ainda há aquelas que se arrastam, monótonas. Apesar desta intrínsica heterogeneidade o leitor consegue apreciar o quão díspares são os entendimentos do ofício entre cada um dos entrevistados. Cortázar e Nabokov parecem extremos. Enquanto são os personagens das histórias do primeiro que "descobrem" o que vai ser narrado, o segundo afirma que os seus são operários, escravos nas galés. Leitura tranquila. Como acontece quando conhecemos melhor uma pessoa certas entrevistas nos fazem querer ler algo dos autores, enquanto outras definitivamente nos previnem deles. E assim segue a vida. [início 19/06/2012 - fim 29/06/2012]
"As entrevistas da Paris Review - vol. 2", Arthur Miller, Vladimir Nabokov, John Cheever, Elizabeth Bishop, Tennessee Williams, Joseph Brodsky, Julio Cortázar, Milan Kundera, Marguerite Yourcenar, Martin Amis, Hunter Thompson, Louis Begley, Salman Rushdie, tradução de George Schlesinger, São Paulo: editora Companhia das Letras, 1a. edição (2012), brochura 14x21 cm, 451 págs. ISBN: 978-85-359-2095-6 [edição original: The Paris Review Interviews (New York), 1966, 1967, 1976, 1979, 1981, 1983, 1984, 1998, 2000, 2002, 2005]