terça-feira, 30 de janeiro de 2007

Madame Sade de Amherst

Depois do baque com o livro anterior (do Demétrio Magnoli, repleto de "realidade real", como ele mesmo alcunhou) resolvi que devia ler algo diferente, como naquelas ocasiões onde precisamos tirar um sabor amargo da boca antes de se aventurar por algum prato novo. Este belo livro de poemas já estava frequentando minha mesa de cabeceira havia umas boas semanas. A Emily Dickinson entrou no meu imaginário com um livro da Camille Paglia chamado Personas Sexuais. Aprendi ali a me envolver com as imagens fantásticas de uma mulher muito enigmática mas de voz sonante. Nesta edição há 245 dos quase 2000 poemas que ela escreveu. A tradução é de José Lino, que assina uma introdução muito boa de ler. Há também um prefácio de Paulo Henriques Britto, igualmente útil ao leitor inexperiente na moça de Amherst (Massachusetts). Não é um livro para se ler de uma vez, mas sim para se abrir ao acaso e tentar entender suas sugestões. Já me aventurei por cerca de 50 dos poemas, quando tiver terminado escreverei um tanto mais aqui. Gosto de ler quando pego o ônibus que passa pela "faixa nova" pois fico aproveitando a mata verde ao redor para ajudar-me a refletir sobre as imagens que ela é capaz de produzir. Este é meu jeito vulgar de ler poesia quase-metafísica, mas decididamente bela poesia. Daqui há algum tempo vou escrever um tanto mais.
"Alguns Poemas", Emily Dickinson, tradução de José Lira, editora Iluminuras, 1a. edição (2006) ISBN: 85-7321254-3

sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

leitura obrigatória


Demétrio Magnoli é cientista social e escreve regularmente em jornais brasileiros sobre relações internacionais e política. Certamente nem tudo o que ele escreve têm aceitação imediata por seus pares na academia ou por seus colegas analistas políticos, todavia suas opiniões são reconhecidamente muito respeitadas. Neste livro há uma seleção dos artigos mais importantes publicados nos últimos três ou quatro anos. Não há assunto polêmico que tenha ficado longe de sua verve descritiva: globalização, desemprego, o papel da ONU, economia, mercosul, guerras no oriente médio, áfrica e nas grandes cidades brasileiras, religião, terrorismo (de e contra o estado), política nacional, compra de votos, cotas públicas nas universidades e eleições. Tudo o que ele escreve pode e deve ser discutido, mas há pouco espaço para hipocrisias ou ingenuidade quando refletimos suas opiniões. Nestes tempos bicudos onde a grande e imensa maioria da população pega emprestadas idéias dos outros e as usa sem o menor pudor a leitura deste livro deveria ser obrigatória. Nestes dias de barbárie intelectual onde "achismo" é o grande motor das conversas encontrar as ponderações contidas neste livro nós dá a sensação que de fato nem tudo está perdido. Acredito ser ainda mais necessária a leitura deste livro por todos os jovenzinhos (e mesmo os velhinhos e velhacos deste país) que ainda se iludem com as frases ocas dos teóricos do "nunca antes neste país" e de outras bobagens deste calibre. Tivéssemos no Brasil um debate menos tolo dos problemas nacionais e do real papel do Brasil no mundo encontraríamos nos curtos mas abrangentes ensaios deste livro uma fonte de referência da maior importância. Belo livro.
O Grande Jogo, Demétrio Magnoli, editora Ediouro, 1a. edição (2006) ISBN: 85-00-02069-5

quarta-feira, 17 de janeiro de 2007

onde está Jeeves?


Este é o livro mais divertido que li este ano. Li em pouco mais de um dia, mas no final estava poupando os capítulos para ter mais tempo de prazer. Voltei a algumas passagens várias vezes e passei por louco mais de uma vez ao rir sozinho no ônibus, enquanto lia. Há muito tempo leio menções ao mordomo ideal Jeeves e ao humor ferino de Wodehouse, escritor britânico que morreu velhinho na segunda metade do século passado, após ter publicado quase 100 romances. Em geral toda vez que alguém quer citar o humor típico atribuído aos ingleses lembra dos diálogos entre o impenetrável Jeeves e aloprado Bertie. "Ask Jeeves" inclusive deu nome durante algum tempo a uma ferramenta de busca da internet (hoje simplesmente ask.com). "Obrigado, Jeeves" é o primeiro de uma série de quase 30 que Wodehouse dedicou a Jeeves e seu patrão Bertram Wooster. É um livro delicioso de se ler, cheio de ironias, sarcasmos, tiradas rápidas, preciosismos, citações históricas e literárias. Apesar de terem sido escritos há mais de meio século o livro é pleno de frescor e vida. Os personagens são idealizados e algo excêntricos, claro, mas nada que surpreenda ou choque um vivente deste agitado início de século. Todo aquele que se interesse por compreender o comportamento humano ou goste de diálogos rápidos e inteligentes vai encontrar neste livro uma festa para os sentidos. Já encomendei dois outros volumes que foram traduzidos no Brasil ("Então tá, Jeeves" e "Sem dramas, Jeeves"). Certamente vou comentá-los neste espaço em breve.
"Obrigado Jeeves", P.G. Wodehouse, tradução de Cássio de Arantes Leite, editora Globo, 1a. edição (2005) ISBN: 85-250-3962-4

orientalismo


Neste pequeno livro há quatro contos curtos de Stèphane Mallarmé, muito mais conhecido por seus belos poemas simbolistas. Os contos foram escritos na época que a curiosidade européia em relação aos hábitos e culturas distintos do oriente era muito grande. São histórias que lembram aqueles de Sherazade e das mil e uma noites mas o tratamento dado pelo poeta os transfiguram totalmente. São detalhistas e plenos de mistério, como se o autor estivesse premeditadamente escondendo algo ainda mais terrível e mágico dos leitores. A edição inclui também um ensaio de Dirceu Villa, que contextualiza a produção destes contos na obra do poeta e também uma carta do próprio Mallarmé para seu contemporâneo e poeta Paul Verlaine, onde ele explica a gênese dos contos. Vale a pena conferir um tanto deste mundo mágico apresentado por Mallarmé.
"Contos Indianos", Stèphane Mallarmé, tradução de Dorothée de Bruchard, Editora Hedra, 1a. edição (2006), ISBN: 85-7715-017-8.

domingo, 14 de janeiro de 2007

um professor e tanto

Este livro é uma delícia. Achei por acaso em uma daquelas paradas em uma livraria estranha, que não conhecemos bem. Foi um achado. Eu conhecia o sujeito por conta do Joyce (sempre ele). Em uma entrevista com o McCourt anos atrás ele descreve a experiência de adquirir um exemplar da primeira edição do Ulysses como a coisa mais mágica que ele já havia vivido (também pudera, o mimo está na casa das muitas dezenas de milhares de libras, euros, dólares). Mas este livrinho descreve um pouco dos 30 anos dele como professor do "nível médio" nos Estados Unidos com uma fluência que prende até o mais chato dos professores ou leitores. Há muito de "parecido" entre a experiência dele e aquela que cada um de nós que já combateu o bom combate de dar aulas vive. Apesar do risco o livro está longe de ser piegas, pleno de auto-comiseração, aborrecido ou repetitivo. Mesmo em se tratando de um sistema pedagógico muito diferente (e melhor, confessemos) que o nosso, há muitas coincidências entre os questionamentos e desafios pelos quais ele passou em sua longa carreira. Recomendo fortemente o livro. Difícil não se identificar com o sujeito. Há uma tradução em português que é fácil de achar: "Ei, professor", tradução de Rubens Figueiredo, editora Intrínseca, ISBN: 85-98078-13-1.
Teacher Man - a memoir, Frank McCourt, Scribner, 1st. ed. (2005), ISBN: 0-7432-9417-3

Alguma Poesia


Ganhei de presente este curto livro de poemas do próprio Escobar, com dedicatória generosa e carinho ao vivo. Mas não foi por isto que gostei imensamente. São poemas curtos que contam uma trajetória, a de um menino de Fortaleza dos Valos que vira poeta e vai se descobrindo poeta e ainda não parou de poetar. Lembrei do Gerardo de Mello Mourão em "O País dos Mourões". Mas terá lido o Escobar algo do Gerardo Mourão? Vou ter de perguntar a ele. Há passagens muito bonitas, com as quais todos aqueles que tiveram uma infância perto dos rios, das árvores, das pessoas, dos problemas, das descobertas, se identificam e se assustam. É um livro para se ler e reler quando ficamos com saudades de um momento ou outro da infância, ou quando queremos guardar um tanto mais aquele sentimento que temos quando temos notícia nova de algum velho amigo. Muito bom.
Curta-Metragem, Escobar Nogueira, Íbis Libris Editora, 1a. edição (2006), ISBN: 85-89126-90-0

a odisséia de penélope

Este é um livro singular. Margaret Atwood foi convidada para reescrever o mito de Ulysses (Odisseu) e Penélope. É um livro curto que conta uma versão um tanto mais sombria do mito. Odisseu ficou mesmo passeando pelo Mediterrâneo com sua turma e deixou a jovem Penélope com um grande fardo, sozinha em Ítaca. Assim como no original suas escravas são mortas juntamente com os pretendentes, mas agora há uma explicação sexista para a coisa. Esta versão é reconhecidamente baseada nas pesquisas antropológicas de Robert Graves, sempre uma fonte seminal quando se trata dos gregos. Gostei e fiquei a matutar uma chance de reler o velho Homero, senhor dos cantos. Será que consigo?
"A Odisséia de Penélope", Margaret Atwood, tradução de Celso Nogueira, Companhia das Letras, 1a. edição (2005), ISBN: 85-359-0735-5

terça-feira, 2 de janeiro de 2007

Outra surpresa do Schott

O primeiro livro do Shott que eu li foi uma maravilha. Era o livro que eu teria escrito caso tivesse uma outra disposição, muito interessante mesmo. Mas eu quero registrar aqui os livros que LI em 2007 portanto vamos em frente. Foi publicado a pouco no Brasil mais um exemplar das idisioncrasias do sujeito, focadas desta vez na culinária e no universo particular que ronda esta mania (ou seria mesmo uma forma de arte?). Há um pouco de tudo ligado a culinária: como se classificam os gostos?; quais foram as causas mortis de alguns notáveis?; qual é mesmo o veneno mais adequado para cada situação?; quem foi mesmo Brillat-Savarin?; como se organiza uma mesa em uma recepção?; como se diz "alho" em sueco?. Está tudo lá ao alcance dos olhos. É um livro para se ter a mão antes de uma festa gastronônima, como Bouvard et Pécuchet gostariam que fizéssemos. Muita informação inútil diriam alguns, mas vale uma folheada, apesar de ser mesmo totalmente descartável, confesso.
"Miscelânea da boa mesa de Schott", Ben Schott, tradução de Adalgisa Campos da Silva, Editora Intrínsica, 1a. edição (2006) ISBN: 85-98.0781.58