Essa antologia de poemas de Cees Nooteboom me acompanha desde fevereiro, quando a encontrei - "drowning in honey, stingless" - na La Central de Callao (em Madrid). Desde aqueles dias outros volumes e leituras tomaram o seu lugar, açodados e esquecidos da boa educação, mas assim como com os demais livros de poesia que li neste ano (volumes de Ricardo Aleixo, Haroldo de Campos, Romar Beling, Robert Louis Stevenson, Vladimir Nabokov, Edward Lear, Carlos Saldanha Legendre, William Faulkner, W.G. Sebald, Cees Nooteboom e Ajo) a certeza de voltar cedo ou tarde a ele recobria-o com uma camada adicional de encantamento. Ontem, quando cheguei ao último dos poemas da antalogia ("Calera y Chozas", de 1960) e li "... nadie se sube / el viejo en su banco / espía con ojos ávidos / el tren viviente // quizá sea siempre así / el jefe de estación pita tres veces / y agita el banderín rojo ; el tren tiembla y chilla / en el paisaje anhelante. // quizá nunca volveré / a Calera y Chozas." senti que também eu nunca voltarei a muitos lugares que visitei e amei um dia. Como os poetas engendram algo que transmite exatamente os sentimentos que experimentamos num determinado dia (porém raramente verbalizamos) é algo que nunca deixa de me surpreender. Essa antologia reúne seis décadas de produção poética, desde "El poema negro" (de 1960), passando por "Poemas cerrados" (de 1964); "Ausente, presente" (de 1970); "Abierto como una concha, cerrado como una piedra" (de 1978); "Cebo" (de 1982); "El rostro del ojo" (de 1989); "Autorretrato de otro" (de 1993, que já resenhei aqui); "Así pudo ser" (de 1999) e "Dulzamara" (de 2000), chegando a "Luz por todas as partes" (de 2012). Cabe registrar que essas datas correspondem às traduções espanholas. Caso seja o caso de conferir aquelas das edições originais deve-se consultar o site do Nooteboom. O tradutor, Frederico García de la Banda, apresenta em uma breve introdução as dificuldades específicas de verter poesia do holandês para o espanhol. Os poemas se deixam ler com vagar. Quase sempre há uma citação neles, uma cifra hermética, uma chave mágica para um mundo distinto do nosso. Nooteboom rende homenagem a pensadores e poetas. Conversa com Ungaretti, Wallace Stevens, Virgílio, Bashô, Lucrécio, Li Ho. Usa a poesia para fixar uma experiência visual, um quadro, uma exposição, um arrebol que viu no oriente, um jardim coreano onde descansa. Registra epifanias religiosas, o contato com o mítico e o sagrado. Faz filosofia como um poeta. São poemas de um viajante, de um sujeito que conheceu mundos e pessoas, cidades e tradições. Ah!, Nooteboom, como invejo tuas viagens e experiências, mas sem tua erudição, sem o grego e o latim como guias, sem as horas e os anos de vigília com os livros, como seriam minhas memórias destas mesmas viagens, destas mesmas experiências? Talvez eu também sonhasse quando li: "Entonces vi / en el parque de Charlottenburg / una sombra dibujada contra el sol / envuelta en una luz / que me deslumbró // Un instante, una mirada. / La de ella, esquiva, / a juego con las hojas que caían, / el negro de estanque, / el frío de otra vida. // ?Lo que ella vio? / Un hombre en un banco / soñando con un poema. // Otoño, caía la tarde, / los cuervos regresaban a casa, / manchas que gritan." Vou logo ali continuar a sonhar e já volto.
[início: 15/02/2014 - fim: 05/10/2014]
"Luz por todas as partes: Antología", Cees Nooteboom, tradução de Fernando García de la Banda, Madrid: Visor Libros (volumen DCCCXXII de la colección visor de poesía, Dutch Foundation for Literature), 1a. edição (2013), brochura 12,5x19,5 cm., 303 págs., ISBN: 978-84-9895-822-5 [edição original: Licht overal (Antwerpen/Netherlands: De Bezige Bij) 2012]
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