Consegui este livro graças aos esforços do Miguel, paciente mercador da Calle Corrientes. A edição é muito boa, parte de uma coleção da Alfaguara chamada "textos de escritor", e reune textos publicados originalmente em jornais em 1995 e 1996. São 104 artigos, um para cada domingo destes dois anos. Gosto muito do Javier Marías escritor de ficção (já li seus romances e boa parte de seus livros de contos), mas suas crônicas e seus ensaios formam um conjunto que não me canso de recomendar. No caso deste conjunto de crônicas o arrebatamento continua. Não há nada que me pareça datado, nenhum texto que me parecesse irrelevante ou dispensável. Não conheço nenhum outro escritor e/ou jornalista que mantenha tal qualidade em textos que a princípio são produzidos para consumo rápido e descompromissado em jornais. Nestes textos Javier Marías demonstra ser um bom observador, é sempre incisivo e opinativo, mas também bem humorado e irônico, didático quando é possível sê-lo. As crônicas parecem contadas por ele em um encontro privado, em uma conversa compartida de final da tarde, no qual acompanhamos seu raciocínio, sua forma de pensar os temas. Não há como sintetizar este belo livro em poucas frases, mas cito aqui uma: " Dizia Ortega y Gasset que os imbecis são muito mais perigosos que os homens maus, pois estes descansam de sua maldade, enquanto que aqueles nunca são capazes de abandonar sua imbecilidade. Supounho que é por isto que não basta rir dos sintomas grotescos de nosso tempo. Suponho que é por isto que não devemos nos permitir desdenhá-los e nos omitir, pois os imbecis são perigosos e os imbecis são numerosos." Haverá descrição mais perfeita de nosso país, de nosso povo, de nosso patético governo, hoje mesmo, mais de quinze anos após este texto ter sido escrito? [início 27/05/2010 - fim 19/06/2010]
"Mano de sombra", Javier Marías, editora Alfaguara, 2a. edição (1997), capa-dura 13,5x22,5 cm, 333 págs. ISBN: 84-204-8357-5
Um comentário:
O argumento de Ortega Gasset, lembrado por Javier Marias, bem como a sua conclusão ao final, ambas exigem a nossa concordância. Abraços.
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