sábado, 12 de abril de 2014

desde que te vi morir

"And in the twilight toward me a man / comes, class. I recognize / your energetic stride. You haven't / changed much since your died. // Y en el crepúsculo viene hacia mí / un hombre, llama. Reconozco / tus enérgicas zancadas. No has cambiado / mucho desde que te vi morir." Encontramos em "Desde que te vi morir" dezoito poemas de Vladimir Nabokov, escritos entre 1919 e 1956, publicados quase todos em revistas e jornais antes da edição em livro, em 1970. Javier Marías os traduziu em 1979. Em 1999, no centenário de nascimento de Nobokov, os poemas foram revistos e reeditados numa bela edição da Alfaguara. O livro inclui dezoito problemas de xadrez inventados por Nabokov (que era um aplicado jogador). Estes problemas e suas soluções fazem parte da edição original e foram traduzidos por Félix de Azúa, que assina também uma nota prévia ("La poesía del ajedrez"). Encontramos por fim cinco ensaios curtos assinados por Marías ("Para que Nabokov no se le cargue - presentación o disimulo"; "Los imposibles pasos del exiliado ruso"; "Vladimir Nabokov en éxtasis"; "El canon Nabokov"; "La novela más melancólica - Lolita recontada"). Assim, neste pequeno livro encontramos ao menos três alegrias distintas: alguns dos poemas de Nabokov, as opiniões fortes de Marías sobre um de seus autores mais admirados, uma desafiadora amostra da paixão de Nabokov por xadrez. Começo por este último conjunto: não é tarefa para amadores. Os problemas são difíceis, mas como há soluções e variantes, aprendemos com elas. Féliz de Azúa nos explica que há um paralelo entre a estrutura argumental básica de alguns livros de Nabokov com o tema dos problemas enxadrísticos, pois a peça de xadrez (ou o protagonista) que se movimenta provoca sua destruição (e é a nostalgia de sua posição/status anterior  - que gera o movimento inicial - que implicará nesta queda e/ou morte). Interessante. Senti saudades de meus dias de enxadrista furioso. Os ensaios de Javier Marías sempre são um assombro. Ao mesmo tempo que informam sobre a vida de Nabokov eles dão pistas sobre suas escolhas literárias e método de tradução (afinal Nabokov é também o tradutor de sua obra, quase sempre escrita em russo e depois transcrita por ele para o inglês, ou como no caso de sua obra mais conhecida, "Lolita", escrita originalmente em inglês e depois vertida para o russo). Nos poemas a paisagem parece não existir. O narrador está sempre olhando o céu, as estrelas, ou um mundo interior, abstrato, onde há apenas o vazio, os pensamentos, as idéias. Num poema o leitor encontra um corredor, um hotel, uma vela, mas logo essa última se apaga e deixa narrador e leitor novamente na escuridão. São poemas densos, que deixam-se ler com vagar e cobram um bom tempo de reflexão. São poemas que antecipam as névoas de um inverno longo e frio mas ao menos parecem dizer: ainda podes se preparar, há tempo.
[início: 22/02/2014 - fim: 10/04/2014]
"Desde que te vi morir (Vladimir Nabokov: una superstición)", Vladimir Nabokov, tradução de Javier Marías e Félix de Azúa, Madrid: Alfaguara (Grupo Santillana de Ediciones), 2a. edição (1999), capa-dura 19x27,5 cm., 141 págs., ISBN: 978-84-204-7853-9 [edição original: Vladimir Nabokov, Poems and Problems (New York: McGraw-Hill, 1970), edição original da tradução: revista Poesía, n0. 4, verão de 1979 (Madrid, Espanha)]

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