terça-feira, 5 de novembro de 2019

helena

Nunca havia lido essa peça, nem tampouco cheguei a ver uma apresentação dela, mas conhecia sua trama (graças ao bom Robert Graves, sempre o melhor artífice das associações possíveis sobre os gregos). Eurípides a escreveu no século V a.C. A peça baseia-se em uma variante da história mais conhecida de Helena de Troia (ou de Esparta). Na Ilíada aprendemos que Helena, mulher de Melenau de Esparta, foi sequestrada por Páris, filho de Príamo, rei de Troia. Desta forma ela é a causa material da longa guerra entre gregos e troianos, da morte de tantos guerreiros de ambos os lados. Em uma outra versão do mito, registrada por Heródoto e alguns outros, Helena foi transportada logo após seu sequestro para o Egito (para Mênfis), abandonada por Paris e lá mantida, incógnita, por dez anos, até ser reencontrada e levada por Menelau de volta a Esparta. É esta a variante utilizada por Eurípides para construir sua peça. Menelau, após a destruição de Troia pelos exércitos gregos, encontra nas ruínas da cidade uma Helena, mas não a sua. Esta nada mais é que um simulacro, um fantasma, um espectro engendrado por Hera, que enganou os sentidos dos dois grupos de combatentes durante os dez anos da guerra. Helena e Menelau, assim como os demais guerreiros espartanos, embarcam em um navio, mas navegam erráticos por longos sete anos pelo Mar Egeu, jamais alcançando Esparta. Imediatamente antes dos sucessos da peça, o navio deles naufraga nas costas do Egito. Enquanto Menelau procura ajuda, Helena e os demais marinheiros que sobreviveram ao naufrágio abrigam-se em uma gruta próxima da costa. Quando Menelau chega a cidade (Mênfis) encontra lá a verdadeira Helena, sua mulher há tanto anos sequestrada (na peça são 17 anos). A princípio ele pouco acredita na incrível semelhança entre a mulher que encontra no palácio e aquela que havia deixado na gruta marinha, mas após um de seus marinheiros alertá-lo que o espectro da outra Helena havia desaparecido no ar, alçado aos céus, desaparecido, ele passa a acreditar ter sido ludibriado pela deusa (Hera jamais perdoou Helena ter sido oferecida como prêmio a Páris após este ter escolhido Afrodite a mais bela das deusas e, cabe dizer, o fato de Helena ser filha bastarda de seu Zeus tonante). A peça gravita os sucessos que o casal finalmente reunido, Helena e Menelau, precisam engendrar para conseguirem fazer-se ao mar novamente, fugirem do palácio egípcio em segurança e voltarem para Esparta. A Helena de Eurípedes é uma mulher valorosa, com força moral e psicológica que supera em muito os engenhos de um tosco Menelau. É ela quem concebe todas as ações que ambos precisam tomar. Diversão garantida. A edição é bilíngue. Uns poucos comentários críticos e um prefácio assinado pelo próprio tradutor, Trajano Vieira, completam o volume. Seguro que ninguém perde tempo lendo uma peça clássica, um drama como este. Aprende-se um bocado, seja sobre a miríade de mitos que a sustentam, seja pelos matizes de entendimento de como opera a psique humana, de como nós fazemos uso da ficção para suportarmos a complexidade das paixões humanas, as surpresas do acaso, as vicissitudes da vida. Mas é hora de voltar a fazer-se ao mar. Vale! 
Registro #1465 (drama #15) 
[início: 29/08/2019 - fim: 31/08/2019] 
"Helena, de Eurípides, e seu duplo", Eurípides, tradução de Trajano Vieira, São Paulo: Editora Perspectiva (Coleção Signos #59), 1a. edição (2019), brochura 15x20,5 cm., 272 págs., ISBN: 978-85-273-1145-8

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