Os livros de Amélie Nothomb são sempre pequenos, mas invariavelmente deixam o sujeito moído por dentro no final. Difícil não ficar pensando um tanto, não ser arrebatado pela combinação de idéias que ela apresenta. A história é tão surpreendente que prefiro não incluí-la entre romances, pois acredito que não há a imaginação que supere a realidade. Neste relato autobiográfico Amélie Nothomb conta sua experiência como funcionária de uma companhia japonesa no início dos anos 1990. Ela é contratada para ser intérprete mas a rígida organização da companhia torna inevitável que ela seja realocada em posições cada vez mais subalternas, terminando seu ano de contrato como atendente dos banheiros da empresa. Tudo se passa como um ritual de passagem que ela devesse enfrentar para seguir seu caminho, sua vida. As reflexões dela são objetivas, seminais. Os demais personagens são antes patéticos que estranhos a um ocidental. Eles são os "chefes" da narradora, primeiro a chefe imediata, Fubuki, depois, Saito, Umashi e enfim, Haneda, o presidente da companhia. Com todos eles a narradora tem passagens que flertam com o cômico, mas são retratos de um assédio moral consentido, a forma mesmo de organização do trabalho no Japão. Excelente livro. Anos atrás vi um filme baseado nele, com a deliciosa francesinha Sylvie Testud fazendo o papel de Nothomb. À época tudo me pareceu tão impossível e surreal que não me animei em ler o livro (é deste tipo de tolice que padecemos às vezes). Todo aquele interessado em entender melhor culturas diferentes e distantes aproveita muito deste livro, principalmente por nos apresentar como um princípio de realidade, na forma de ferramentas mentais para se livrar, como neste caso, do japão idealizado e glamourizado, que tendemos a acreditar existir. Acabei de ler um livro de Cees Nooteboom onde algo semelhante acontece, em uma história que também se passa no Japão. Voltarei logo a este tema portanto. [início - fim 25/02/2009]
"Medo e submissão", Amélie Nothomb, tradução de Clóvis Marques, editora Record (1a. edição) 2001, brochura 14x21, 142 págs. ISBN: 85-01-05840-8
Um comentário:
Boa dica de leitura! Fiquei interessado por essa "fenomenologia" das formas de descensão - é assim que se escreve? - social. Vou procurar o livro!
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