"Pra começo de conversa" foi lançado no Ponto de Cinema, como parte das comemorações do Bloomsday Santa Maria de 2009. Os autores me convidaram para escrever a orelha do livro. Apesar de entender o comentário de meu amigo Ronaldo Lippold acho que não tenho muito que acrescentar ao que escrevi ali. Portanto, sigamos com o baile: James Joyce passou por atribulações mil e teve de ser paciente para conseguir publicar Dublinenses da forma que imaginou cada um de seus quinze contos. Suas histórias, ambientadas na ainda provinciana Dublin do início do século passado, incomodaram tanto pela forma como são descritos os personagens quanto pela crítica implacável aos hábitos e costumes da época. Um século depois e em outro hemisfério eis que quatro santa-marienses de fato ou adoção: Tânia Lopes, Athos Miralha Cunha, Orlando Fonseca e Antônio Cândido Ribeiro, resolveram publicar um livro reunindo crônicas genuinamente santa-marienses. Cada um deles, em seus estilos, vozes, manias e idiossincrasias, registra um tanto desta Santa Maria que é passagem e porto de tantos gaúchos, brasileiros e viajantes. Não se trata de ficar aqui comparando os contos de Joyce e as crônicas destes quatro amigos, mas sim de tentar entender como a palavra pode ser utilizada para reconhecermos melhor o lugar em que vivemos e as pessoas com quem interagimos todos os dias. Nas histórias do Athos a memória flerta com um desejo de modificar rapidamente o mundo. Acompanhamos seu olhar sobre situações banais: a rotina de uma casa bancária; os encontros de boleiros saudosistas, os causos de mateadores e churrasqueiros sempre listos. Leio suas histórias e penso no duro silêncio de uma roda de chimarrão. Já nas histórias do Orlando encontramos o registro da vibrante vida deste início de século, dos horários apertados que seguimos, das correrias pelas quais passamos. Atarefados deixamos de refletir sobre o que fazemos, mas ele congela em seu texto situações que identificamos rapidamente como acontecidas, ou conosco, ou com um vizinho, ou com um parente, como não? Tânia por sua vez usa sua memória de certos diálogos, de certas situações, de certos compromissos e os transforma em belas histórias que lemos com prazer. O mundo das mulheres, claro, se apresenta mais contundente pela voz de Tânia, sempre observadora. Por fim o Candinho é aquele cronista que “fala” mais diretamente com o leitor, tentando seduzi-lo para seu campo, para suas idéias (e quase sempre conseguindo). Suas histórias têm a força de quem quer entender e contribuir para modificar a realidade. Fico feliz por estas crônicas, enfeixadas como em um buque de flores, prontas para serem lidas e também prontas para homenagear o velho James Joyce neste Bloomsday santa-mariense de 2009. [início 10/05/2009 - fim 16/06/2009]
"Pra começo de conversa: crônicas santa-marienses", Tânia Lopes, Antônio Candido de Azambuja Ribeiro, Athos Ronaldo Miralha da Cunha, Orlando Fonseca, editora Manuzio (1a. edição) 2009, brochura 14x21, 112 págs., ISBN: 978-85-7782-076-4
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