Após uma enfermidade muito debilitante uma mulher morre. Logo após seu funeral a vida de seu marido (George) e três de seus antigos amantes (Clive, Vernon, Julian) parece seguir dominada e enredada por ela. Há um jogo muito interessante neste curto romance de Ian McEwan. Ele alterna (mais do que opor ele contrasta) digressões sobre música clássica e jornalismo político, pragmatismo e arte, amizade e inveja, individualismo e altruísmo. Claro, apesar de algum humor contido, os temas abordados no livro são todos sombrios, o leitor percebe logo que não se trata de um livro para distração leve dos aborrecimentos do dia a dia. Sem ser maçante McEwan descreve algo do processo de construção de uma peça musical sofisticada (Clive é um compositor respeitado, comissionado pelo governo britânico para compor uma sinfonia). Para os melômanos este é mesmo um livro inspirador. Ao mesmo tempo McEwan dá uma idéia de como funciona a redação de um jornal sensacionalista. Cada personagem só se preocupa mesmo com seus problemas e agenda, eventuais pensamentos sobre os outros ocorrem apenas quando estes outros são necessários para seus objetivos imediatos. A frieza e as estratégias mentais que os indivíduos utilizam se justificam pelo hábito apenas. McEwan sabe desnudar a hipocrisia como poucos. O pacto de morte que parece unir todos (especialmente Clive e Vernon) apenas ilustra mais enfaticamente o enorme egoísmo deles. Bom livro. Ainda tenho um ou dois McEwan para ler. Cousa boa saber disto. [início 17/02/2012 - fim 02/03/2012]
"Amsterdam", Ian McEwan,
tradução de Paulo Reis, Rio de Janeiro: editora Rocco, 1a.
edição (1999), brochura 14x21 cm, 181 págs. ISBN: 85-325-1049-3 [edição original: Amsterdam (Londres: Jonathan Cape) 1998]
Um comentário:
Acho esse um dos livros mais bem escritos de McEwan. Há alguns aspectos muito curiosos nesse romance, como ver que a descrição da criação sinfônica que passa pela cabeça de Clive é a mesma de uma conhecidíssima sinfonia (não colocarei spoilers aqui), o que é uma das chaves do final da história. Apenas, como em todos os romances de McEwan, a excelência divide espaço com esquematismos não muito convincentes (herança de quando o autor escrevia roteiros para tv?), e a conclusão deste é um tanto pueril. Mas McEwan sempre é uma leitura muito válida.
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