Cees Nooteboom ganhou o prêmio belga Gouden Uil de 2009 por este livro. Trata-se de um pequeno conjunto de contos (que impressionam pelo encantamento que provocam). Como ficar indiferente a boa mistura de histórias interessantes, originais mesmo, com o uso provocativo de metalinguagem (uso que não chega a intoxicar com referências ou digressões demasiado elípticas, mas que atiçam a vaidade intelectual de quem as lê)? Os contos flertam com o sombrio, com a zombeteira presença da morte, com o enganador poder da memória afetiva sobre nossos atos. Há uma presença grega nos contos de "Los zorros vienen de noche" (na medida em que sempre estamos perto do mar e das tormentas; que os narradores sempre são viajantes, algo desterrados, que experimentam ou confrontam hábitos extrangeiros; que a mitologia sempre pode se confundir com a história). O narrador de Nooteboom louva sempre o leitor, este sujeito que para ele (o narrador e talvez o próprio Nooteboom) é o complemento indispensável dos poetas, aquele que experimenta a forma menos óbvia de felicidade (a do anonimato), aquele que nenhum autor consegue surpreender facilmente, pois demasiada literatura os tornou demasiado exigentes. Os contos são bem inventivos: um velho senhor vê uma fotografia e relembra uma antiga paixão; um casal almoça na praia e experimenta a fúria dos elementos; o narrador de uma das histórias conta os sucessos biográficos de um holandês errante, desterrado (na mais longa das histórias e também a melhor delas, a meu juízo); uma velha senhora vive seus dias com alguma lascívia; um sujeito faz o censo de seus dias cúmplices com companheiros de jogatina e vagabundagem; uma moça fala de seu estado pós-morte e ajusta contas com um amante algo tonto (trata-se de uma teoria da morte, Nooteboom tem 78 anos, já deve estar a pensar mais nestas coisas); um narrador diz (com o mesmo esgar que Orlando usa quando fala de Sasha em um livro de Virginia Woolf - ao perceber-se abandonado): "Fui feliz, mas já não há ninguém a quem eu possa contar esta felicidade". Cees Nooteboom é o tipo de escritor que admiro e que sempre leio com prazer, renovado e reiterado prazer, pois ele sempre é original demais para nos aborrecer. Como encontrar mais coisas deste sujeito se o holandês é impenetrável demais para este velho e cansado Guina, que mal domina o português? Paciência. [início 09/03/2012 - fim 13/03/2012]
"Los zorros vienen de noche", Cees Nooteboom,
tradução de Isabel-Clara Lorda Vidal, ediciones Siruela (Nuevos Tiempos), 1a.
edição (2011), brochura 14x21,5 cm, 138 págs. ISBN: 978-84-9841-530-8 [edição original: 's Nachts komen de vossen (Amsterdam: De Bezige Bij) 2009]
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