Nos livros de Ian McEwan algo de violento sempre é implícito, subliminar ao que é narrado. Em "Cães negros" McEwan apresenta uma história que o leitor pode aceitar como relato de um casamento que fracassa (por incompatibilidade de um casal com a evolução da política de seu tempo ou o entendimento distinto da viabilidade do modelo comunista na economia européia do século XX), mas o que realmente importa no livro é a discussão sobre como situações extremas afetam indivíduos e a coletividade. O livro é pequeno, compacto, McEwan muito inventivo na sua construção, nada linear e previsível. A introdução é realmente muito boa. O narrador de McEwan tem uma empatia muito especial com sua sogra e acredita que a história de vida dela pode tornar-se material bruto para um bom romance. Esta mulher, muito ativa e inteligente, concomitantemente ao casamento e a educação dos filhos, viveu longos períodos de sua vida adulta em uma zona rural da França. Após muitos anos de isolamento e meditação ela sofre um colapso e é internada em um asilo na Inglaterra, onde passa a relatar fragmentariamente suas memórias para o genro. As personagens de McEwan descrevem o impacto da queda do muro de Berlim, falam de suas experiências sexuais nos anos 1960, visitam um campo de concentração na Polônia, fazem longas caminhadas pelo campo, relembram os anos duros, de privações materiais e espirituais, do pós-guerra na Europa. Mas quem domina o romance são os "câes negros" do título, metafóricos do mal absoluto e da depressão, do mal estar geral da civilização. McEwan retarda habilmente o momento em que explica sua metáfora. Ficamos enredados em sua poderosa narrativa ainda por muitas páginas antes de perceber que viver é uma espécie de confronto permanente com nossos "cães negros" pessoais. Grande livro. [início 05/03/2012 - fim 07/03/2012]
"Cães Negros", Ian McEwan,
tradução de Aulyde Soares Rodrigues, Rio de Janeiro: editora Rocco, 1a.
edição (1993), brochura 14x21 cm, 151 págs. ISBN: 85-325-0417-5 [edição original: Black Dogs (Londres: Jonathan Cape) 1992]
Um comentário:
Ele é mesmo muito bom, gosto muito e pretendo ter esse que vc comentou tão bem, só não sei quando vou poder ler,
um abraço, merci,
clara
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