sábado, 11 de julho de 2020

com el agua al cuello

"Con el agua al cuello" é a vigésima nona aventura de Guido Brunetti, comissário da polícia veneziana. Foi publicado recentemente, em março. Mesmo com as dificuldades da pandemia consegui meu exemplar em poucos dias (graças a Casa del Libro e a DHL, por supuesto). Esse volume trata da sistemática contaminação das águas da cidade e de como um sujeito cuja mulher está em estado terminal, com câncer, é envolvido em uma trama de acobertamento, perpetrada justamente pela empresa responsável por verificar a qualidade da água. A história se passa no verão, com a cidade repleta de turistas, o que dificulta o deslocamento dos personagens pela cidade. Desta vez poucos dos costumeiros personagens se apresentam, como se fosse uma peça escrita para ser encenada em um teatro de bolso, com pouca movimentação e pouco público. Guido Brunetti e sua colega comissária Griffoni se encarregam de investigar as circunstâncias da morte de um químico, responsável pela coleta e análise de amostras da água que é servida para a população. Os dois contam com a ajuda da sempre eficiente secretária Elettra. A narrativa usa pouco como cenário o escritório da comissaria, preferindo levar os protagonistas e os leitores por vários cafés da cidade (com seus típicos tramezzini veneziani). Como sempre acontece nos romances policiais de Donna Leon a chave estrutural segue um drama grego clássico, no caso a trilogia de Orestes de Ésquilo: Agamemnon, Coéforas e Euménides. A questão moral em jogo, o tema, é a maldição que recai sobre aqueles que cometem um crime contra a cidade (a pólis). Todavia, assim como na peça final da trilogia, há uma nítida transição desde o ciclo sangrento do início (quando são as Erínias que comandam o destino das gentes) para o surgimento de uma justiça conciliadora, civilizada, na figura de Palas Atena. Donna Leon sabe tornar crível toda a trama, cujo tema é atualíssimo e certamente se repete por todas as cidades (ela inclusive cita uma tentativa recente de privatização das águas italianas, que não chegou a ser autorizada, após dois plebiscitos). A bem da verdade a trama é um tanto parecida com um outro volume dela, o décimo-quinto, "Veneno de cristal", que também fala sobre a fatal combinação entre a poluição das águas da laguna e a avareza. Entretanto, em "Con el agua al cuello" a solução é mais sutil, melhor resolvida dramaticamente, demonstrando como Brunetti é um personagem complexo e, como não, universal. A ver o que ela nos preparará para sua trigésima aventura, no ano que vem. Belo livro. Vale! 
Registro #1552 (romance policial #96) 
[início: 06/06/2020 - fim: 09/06/2020]
"Con el agua al cuello", Donna Leon, tradução de Maia Figueroa Evans, Barcelona: Seix Barral / Biblioteca Formentor (Editora Planeta S.A.), 1a. edição (2020), brochura 13,5x23 cm., 344 págs., ISBN: 978-84-322-3638-9 [edicão original: Trace elements (Zürich: Diogenes Verlag AG) 2020]

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