Ano passado li o Quarteto de Alexandria, de Lawrence Durrell, e lá fui apresentado ao mundo mágico dos poemas de Konstantinos Kaváfis. Eu conhecia na verdade um ou outro dos poemas dele por conta de outros entusiastas, como Celso Braida, um filósofo amigo meu, que traduziu uma seleção deles anos atrás e don Ronái Rocha, que me mostrou os livrinhos. No ano passado mesmo encontrei esta bela edição bilíngue da Odysseus, dando conta que a íntegra dos 154 poemas de Kaváfis tinha sido pela primeira publicada cá no Brasil. Comprei de pronto e só agora nestas férias longas de Santa Maria tive a chance de ler com calma e deleite os poemas. Konstantinos Kaváfis nasceu e morreu em Alexandria, no Egito, mas sempre escreveu seus poemas em grego. Consta que era um homem bastante solitário, mas esquecido dos homens e dos muitos problemas pelos quais passou o mundo durante sua vida (1863-1933), construiu aos poucos uma obra respeitadíssima. Muitos escritores (não apenas gregos ou egípcios) não escondem seu débito literário a ele, apesar de apenas curtos 154 poemas seus terem sido produzidos. Nikos Kazantzakis disse que "escrevendo e retocando obstinadamente seus poemas até a forma com que desejou que se tornassem conhecidos do mundo, Kaváfis criou uma das obras poéticas mais originais de seu tempo". Os poemas estão publicados na ordem cronológica em que foram escritos. A maioria envolve temas históricos e/ou mitológicos que sempre incluem alguma reflexão plena de erudição. Mas o curioso é que ao ler lentamente estes poemas aos poucos fui lembrando de coisas minhas, sentimentos meus, que ainda não tinha racionalmente verbalizados. Esta é a mágica de certos livros, que nos escolhem antes de nós os escolhermos. Os poemas de Kaváfis, como um oráculo, me revelaram alguns temas e mesmo dúvidas bem entranhadas. Que experiência ímpar. Ao mesmo tempo que são enigmáticos e cheios de cifras a serem desvendadas os poemas algo que nos fortalecem, lembrando-nos que há mesmo pouca coisa de nova sobre o sol (além do verniz útil e fundamental da ciência e da tecnologia, sem os quais seríamos os mesmos homens que tateiavam a verdade nas planíceis duras da grécia). No final do livro boa parte dos poemas receberam curtas explicações temáticas da tradutora, que também assina uma curta introdução biográfica. Aprendi um par de coisas lendo este belo livro, que manterei por perto por um tempo, para tentar congelar esta sensação confortável (porém muito provavelmente enganadora) de se estar um tanto mais próximo de entender a alma humana.
"Poemas de K. Kaváfis", Konstantinos Kaváfis, tradução de Ísis Borges da Fonseca, editora Odysseus, 1a. edição (2006) brochura 14x21cm, 406 pág., ISBN: 85-88023-79-2
Um comentário:
Aguinaldo, não sabia da existência desse livro! Li as versões do José Paulo Paes, do Trajano Vieira e do Haroldo de Campos, mas é de todo modo uma ÓTIMA surpresa saber que a obra completa do Kaváfis já foi publicada. Como você mesmo disse, a poesia dele é deliciosa de ser lida. Gosto muito da forma como ele nos diz algo e ao mesmo tempo não diz, escondendo, velando, por detrás de uma cena simples, composta com elegância, toda uma dimensão de coisas que só conhecemos quando a dedicação e o amor àquele autor se revelam. É o que, afinal, faz todo bom poeta.
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