O Javier Marías dos livros de ficção é sempre poderoso e original. Já o Javier Marías das crônicas, ou ainda, dos breves ensaios publicados semanalmente em jornal sabe conciliar sua inegável capacidade de convencimento, sua riqueza de argumentação, com uma curiosidade intelectual abrangente. Ele sabe extrair verdades, apresentar assuntos para reflexão, localizar o que é central e importante nos temas de seu tempo. As noventa e cinco crônicas reunidas neste "Lo que no vengo a decir" foram publicados entre dois fevereiros, o de 2007 e o de 2009, no jornal espanhol El País. Seus temas são mesmo variados: há o sujeito que se preocupa com a política, a economia e os "modales" de seu país; há o escritor que reflete sobre a produção literária de nossos dias; o memorialista; o sarcástico e corrosivo antagonista; o homem íntegro e corajoso. A defesa da liberdade e da individualidade está acima de tudo, paira sobre os temas que aborda. Com um sabujo ele fareja fascismos, aponta tiranos, desnuda hipocrisias, investiga desatinos, ri das tolices tão comuns neste início de século tão perturbador. As tolices de Hugo Chávez e de nosso patético Lula são motivo de escárnio para ele; assim como os crimes de guerra perpetrados pelos israelenses contra os palestinos não deixam de ser condenados em um de seus últimos textos. Se eu tivesse de escolher uma única crônica para destacar estaria com um grave problema. Mas deixo aqui um trecho onde ele registra o que espera sempre fazer: "...intentanos, en términos generales, contar, decir y explicar, razonar, argumentar, llamar a atencíon sobre aspectos de la realidad que nos parecem inadvertidos, examinar pros y contras de algún asunto, y desde luego influir, persuadir, convencer y crear dudas. Damos vueltas a nuestras convicciones sobre las que es difícil tener una opinión, porque son complejas o desconcertantes: nos limitamos a exponer nuestra perplejidad y nos abstenemos, por tanto, de emitir una conclusión a la que no hemos llegado". Mas Marías também adverte que não admite: "la gente que se adentra en una pieza más o menos compleja para sacar de ella una conclusión simplona o falsa". Não há nenhum escritor e cronista brasileiro que possa ser comparado a Marías, seja pela qualidade de seus textos, seja pela honestidade intelectual com o qual exerce seu ofício. [início 02/08/2010 - fim 05/09/2010]
"Lo que no vengo a decir", Javier Marías, Editora Alfaguara, 1a. edição (2009), brochura 14x23 cm, 322 págs. ISBN: 978-84-204-2300-5
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