Quem me falou pela primeira vez desse livro, certamente há mais de um ano e com franco entusiasmo, foi o industrioso Tailor Diniz. Mais recentemente o Escobar Nogueira repetiu a indicação com um entusiasmo similar. Com duas referências tão boas (e lamentando não ter seguido de pronto a sugestão inicial do Tailor), acabei comprando o livro no dia seguinte ao encontro com o Escobar. Li "Todos os homens são mentirosos" com um sorriso nos lábios, divertindo-me com a maquinaria literária e a metalinguagem que Alberto Manguel sabe oferecer ao leitor. Isso é acessório, mas estou em uma fase onde tento interpretar o que leio à luz dos esquemas propostos por Orhan Pamuk no O romancista ingênuo e o sentimental, vamos a ver até quando isso dura, pois é claro que alguma teoria ajuda, mas sei que não posso perder o foco, sufocar o prazer genuíno da leitura descompromissada de qualquer texto ou romance. "Todos os homens são mentirosos" lembra o filme Rashomon de Akira Kurosawa (que é baseado no conto Yabu no Naka, de Ryūnosuke Akutagawa - devo ao Hugo Crema a lembrança dessa linhagem). O que se discute no romance é como o exílio forçado afeta cada indivíduo. O primeiro dos narradores de Manguel discute com um jornalista detalhes da vida de um sujeito que sobreviveu a ditadura Argentina e exilou-se em Madrid. Sua curiosidade se concentra nos porquês do sujeito cometer suicídio justamente na noite do lançamento de um livro fenomenal, que faz muito sucesso posteriormente. O segundo narrador é uma das ex-mulheres desse sujeito/escritor, mas sua versão dos fatos é substancialmente diferente. A terceira narrativa é de um cubano exilado, alguém do círculo de amizades do desterro madrillenho do sujeito/escritor. Ele comunica através de carta uma terceira versão dos fatos. Manguel dá voz a um morto na quarta de suas narrativas, o que embaralha ainda mais o entendimento do leitor. Por fim o jornalista, em uma narrativa final, formula sua síntese do que depreendeu das versões anteriores. O resultado é o livro que estamos a ler, fruto de contraditórias e complexas perspectivas dos eventos. Haverá alguma verdade afinal de contas, parece nos perguntar Manguel, também ele um exilado, um dos milhões de latino-americanos perseguidos por ditadores sanguinários. Belo livro. [início 15/12/2011 - fim: 16/12/2011]
"Todos os homens são mentirosos", Alberto Manguel, tradução de Josely Vianna Baptista, São Paulo: editora Companhia das Letras (1a. edição) 2010, brochura 14x21, 179 págs. ISBN: 978-85-359-1745-1 [edição original: Todos los hombres son mentirosos (Barcelona: RBA Libros) 2008]
"Todos os homens são mentirosos", Alberto Manguel, tradução de Josely Vianna Baptista, São Paulo: editora Companhia das Letras (1a. edição) 2010, brochura 14x21, 179 págs. ISBN: 978-85-359-1745-1 [edição original: Todos los hombres son mentirosos (Barcelona: RBA Libros) 2008]
Um comentário:
Manguel é excelente escritor, não? Gosto muito dos ensaios dele, ficam na medida entre a erudição, a opinião, o traço autobiográfico saboroso. Vc já leu o "Biblioteca à noite"? Acho que vc iria gostar muito, é uma espécie de irmão daquele livro sobre as bibliotecas dos escritores que vc comentava dias atrás aqui no blog. "O amante detalhista", outra ficção dele, é uma pérola de concisão e inventividade.
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