"Guerra das gueixas" foi publicado originalmente há quase um século (primeiro de forma seriada em um jornal, depois em livro, em 1918). Nagai Kafu conta a história de uma gueixa ingênua, Komayo. O realismo é a chave do livro, não há falso moralismo nele. O mundo das gueixas é um mundo de escravidão sexual, de convenções anacrônicas, de submissão completa aos desejos dos homens. Kafu nada edulcora a vida libertina das gueixas. Suas alegorias românticas são antes a forma irônica de explicitar a realidade da armadilha social na qual elas estavam imersas. Ele nos ensina algo da etiqueta e do treinamento das gueixas, algo similar ao dos músicos, atores ou dançarinos. A sofisticada educação para o entretenimento e mundanidade custava caro e a "casa das gueixas" (okiya) que as financiavam alcançavam manter as mulheres presas a contratos impossíveis de serem um dia rescindidos por elas mesmas. Komayo, uma garota de vinte e quatro anos, volta a atuar como gueixa após a morte do marido, um sujeito do interior com quem havia se casado após ele pagar sua dívida. A vida do interior lhe parecia insuportável e ela acredita que poderia novamente conseguir um patrono ou um amante na capital japonesa. Ela reencontra Yoshioka, um bem sucedido bancário, com quem havia se relacionado quando jovem. Indecisa entre aceitar a proposta de tornar-se amante deste rapaz ou relacionar-se com um ator de teatro kabuki, Segawa, por quem subitamente se apaixona, Komayo vê ambos se afastarem. Kafu apresenta ao leitor os vários estágios emocionais entre as alegrias e fantasias da paixão e o reconhecimento das perdas. Komayo é uma protagonista que encontra deleite e sofrimento com os mesmos objetos, nos mesmos assuntos e com a mesma intensidade. O amor não é apenas o primo da morte (como já nos ensinou Drummond), mas um monstro voraz que provoca derrotas e ilusões em troca de uns poucos prazeres. Livro interessante. Vamos a ver se encontro algo mais de Nagai Kafu.
[início: 12/12/2016 - fim: 21/12/2016]
"Guerra das gueixas", Nagai Kafu, tradução de Andrei Cunha, São Paulo: editora Estação Liberdade, 1a. edição (2016), brochura 14x21 cm., 246 págs., ISBN: 978-85-7448-267-5 [edição original: Ude Kurabe (腕くらべ) 1916-1917)]
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