Neste volume estão reunidas sete histórias curtas (quatro delas curtíssimas, coisa de quatro ou cinco páginas). "El perro" trata dos encontros tensos entre um cão e uma jovem ciclista, que não aceita a natureza feroz de seu antagonista; "Una historia" conta algo sobre uma mulher que trai sistematicamente seu marido, todas as vezes em que ele viaja, mas que não associa sua traição a ausência de amor ou carinho por ele; "Vanidad" retrata a censura que os filhos de uma velha senhora fazem de seu corte de cabelos, para eles moderno demais, não compatível com a idade dela; "Una mujer que envejece" conta as preocupações de dois filhos sobre a saúde e o destino da mãe, num encontro em que todos estão longe de casa, praticamente estranhos uns aos outros;
"La anciana y los gatos" trata do
choque que as escolhas de uma velha senhora, que mora em uma
cidadezinha isolada no sul espanhol, provoca em seu filho cosmopolita e
prático, que não comunga das escolhas morais de sua mãe; em "Mentiras", um conto epistolar, um filho escreve a sua mulher sobre o
acidente sofrido pela mãe, e das providências que é obrigado a tomar. No último conto, "El matadero de cristal", dividido em seis
partes curtas, uma senhora pensa na possibilidade de provocar reflexão e eventualmente mudar
a opinião dos cidadãos seus contemporâneos sobre os rituais de criação e
abate de animais, assim como o consumo da carne, algo para ela
condenável. Nos sete contos a figura da velha senhora sempre parece ser Elizabeth Costello, uma personagem conhecida dos leitores de J.M. Coetzee. Ele, que recebeu o prêmio Nobel de literatura em 2003, a fez aparecer pela primeira vez em "A vida dos animais", publicado em 1999, depois em "Elizabeth Costello", em 2003 e também em "Homem lento, em 2005. A Costello personagem é uma escritora de opiniões fortes, provocante até a exasperação, que sempre se posiciona, discute temas complexos, como a vida dos animais, a censura e a fé, filosofa sobre a sexualidade, a moral e o mal entranhado nas pessoas. Além do veganismo Coetzee faz seus personagens digressar também sobre o ofício de escrever ficção, a velhice, a relação entre pais e filhos, o destino, o amor e o dever, refletir sobre as consequências de nossas decisões, da dificuldade de topar partido em questões éticas no dia a dia. "A vida não se resume a uma eterna sucessão de criação e solução de problemas", afirma a senhora Costello, em uma das histórias de Coetzee. Talvez esta frase resuma as questões morais discutidas nos sete contos. Nós, homo sapiens, devemos fazer valer mais o nosso tempo de vida, os dias que nos cabem. Sempre provocador o velho e bom Coetzee. Em tempo. Consegui encontrar links para gravações onde o próprio Coetzee lê "El perro", "La anciana y los gatos" e "El matadero de cristal". Achei também links para o texto original de dois contos: "Una mujer que envejece" e "Mentiras" (publicados anteriormente na revista americana The New York Review of Books). "Una historia" e "Vanidad" parecem ser singularmente inéditos, mesmo em inglês. Vale!
Registro #1458 (contos #167) [início - fim : 25/09/2019]
"Siete cuentos morales", J.M. Coetzee, tradução de Elena Marengo, Barcelona/Buenos Aires: El Hilo de Ariadna
(Penguin Random House Grupo Editorial), 3a. edição (2019), brochura,
13,5x22,5 cm., 123 págs., ISBN: 978-84-397-3466-6 [edição original: Moral Tales 2017]
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