"El premio" foi publicado originalmente em 1996 e pertence ao último ciclo de histórias do detetive Pepe Carvalho, criação do industrioso Manuel Vázquez Montalbán. Os "hechos" do romance se dão na fase final do governo socialista de Felipe González (que ficou 14 anos no poder). Contam um tanto da conturbada transição para o governo liberal de José María Aznar (que ficaria seus 8 anos no poder). Foram anos onde escandalos de corrupção, crimes de grupos para-militares atuando à margem da lei, incertezas sobre o futuro da Espanha apontavam para a necessidade imperiosa de alguma renovação política. Certamente estes anos foram de desgosto para Montalbán, um sujeito que não suportava governos despóticos e populistas e teve de amargar o volta de um governo conservador à Espanha. Ele não chegou a viver para ver como os atentados terroristas em Madrid contribuiram para a derrota de Aznar nas eleições de 2004. Seguro que ele sairia pelo Raval pagando rodadas de Cava aos amigos. A história do romance é o que menos importa (trata-se de descobrir quem matou um rico empresário, um típico problema do crime na sala fechada, sempre utilizado em histórias de detetive). O tempo no romance vai e vem. Primeiro acompanhamos os sucessos dos momentos que antecedem a entrega de um importante prêmio literário, patrocinado pelo empresário, ainda rico, mas tecnicamente em risco de perder seu patrimônio e sem o respaldo político oficial que sempre teve em tempos mais favoráveis; depois o romance nos conta como Carvalho chegou a Madrid, contratado para proteger o sujeito que será morto na noite seguinte; na seqüência acompanhamos como o corpo do morto aparece, como é feito o censo dos principais suspeitos, todos presentes no salão de entrega do prêmio literário; volta-se novamente o tempo e seguimos Carvalho em um almoço glorioso (a gastronomia sempre presente em suas histórias) com o empresário; e assim segue o romance, indo e vindo no tempo, apresentando as impressões de Carvalho antes e depois da morte - inevitável, afinal sabemos, quase uma libertação para o enredado empresário. O romance serve para Montalbán refletir sobre a instabilidade dos anos finais do governo socialista, nos explicando como a vontade de manter-se no poder a qualquer custo, lentamente contamina a moral e a ética do mais despreendido e bem intencionado dos governantes. É algo muito parecido com o que vemos atualmente no Brasil. Não há aliança, não há apoio que seja constestado pelos ideólogos e dirigentes do atual governo. Tudo vale para dar continuidade ao modelo de gestão, péssima afinal de contas, e principalmente para manter os milhares de cargos públicos fartamente distribuídos aos amigos, quase sempre inéptos e despreparados. Montalbán nos ensina que a História não é uma ciência exata mas é o tipo de conhecimento que poupa muitos aborrecimentos a quem se dá ao trabalho de estudá-la, sem cabrestos ideológicos ou servilismos típicos do fascismo. A alternância no poder - nas democracias de fato - não é apenas desejável, mas profilática e saneadora. No romance Carvalho reencontra uma bela mulher, que já conhecemos do "Assassinato no Comitê Central", publicado em 1981. Nas conversas com ela e seu filho adolescente Montalbán nos apresenta como também a sociedade espanhola (não apenas o mundo político) estava em crise, como a "movida madrilleña" já era apenas um simulacro dos sucessos e do auge nos tempos de pós-redemocratização. "El premio" vale a leitura. Agora só me ficaram faltando "Tres historias de amor" e "Historias de fantasmas". Seguro que estes volumes me encontrarão um dia. Paciência então. [início 09/08/2009 - fim 28/10/2009]
"El prêmio", Manuel Vázquez Montalbán, editora Planeta (1a. edição) 005, brochura 15x23, 347 págs. ISBN 978-84-08-06001-7
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