Quando li recentemente "Pasiones Pasadas", de Javier Marías, eis que logo no início ele menciona um plágio, sofrido por ele, tempos idos, na temperamental Espanha dos anos 1990. O plágio teria sido praticado por um sujeito que Marías desdenha breve mas cruelmente, se furtanto de dar os nomes dos membros do corpo de jurados que deram ao livro plagiado um importante prêmio literário espanhol. A crônica plagiada era uma onde Marías descrevia seus dias na sereníssima e inafundável Veneza. Lembro-me bem como vários escritores e artistas citam Veneza em seus escritos: há textos belíssimos de Joseph Brodsky, Evelyn Waugh, Elias Canetti, Woody Allen, Richard Wagner, Igor Stravinsky, onde Veneza é descrita e louvada. Claro, Veneza para mim sempre será a mítica cidade descrita no "Brideshead Revisited", mas esta é outra história, cara talvez apenas ao Luiz Melo ou ao Renato Cohen. Procurei saber quem era o torpe plagiador descrito por Marías e eis que achei este "A tempestade", romance de Juan Manuel de Prada. Lembrei-me de ter visto muito recentemente um filme baseado neste livro. Resolvi lê-lo (há que se respeitar os fados, seguro que sim). É um romance bem acabado, mas nada que desperte muito entusiasmo no leitor. Manuel de Prada inventa um jovem doutorando de artes, que viaja à Veneza. Na noite de sua chegada eis que ele simultaneamente presencia um crime e se torna o principal suspeito do assassinato. Outros personagens se apresentam: um delegado minuncioso, uma concierge voluptuosa, um estafeta canalha, um curador de artes venal, uma artista/falsificadora desejável. O enredo envolve resolver o crime utilizando elementos que estão em um quadro importante de Giorgione (Giorgio Barbarelli da Castelfranco), pintor veneziano do início do século XVI, que se chama exatamente "A tempestade". Giorgone foi discípulo de Bellini ("which one", diria Lord Marchmain). Este enredo lembra, óbvio, o esquema fácil e apelativo de livros como o "Código da Vinci". Logo nas primeiras páginas o leitor já antecipa boa parte dos sucessos do livro. Não há muito o que acrescentar ao enredo. Aos poucos percebemos como será o desfecho. É um livro mal escrito (ou talvez mal traduzido, não sei a certo o que dizer). Manuel de Prada abusa de metáfaros sexuais como se fosse difícil a qualquer vivente emular as curvas e as pudendas de uma mulher, mas nele tudo soa artificial, assexuado demais na verdade. É um livro bobo do começo ao fim, incrível saber que ele ganhou um prêmio Planeta (afinal de contas trata-se de uma boa e tradicional editora, que outorga este prêmio já há tantos anos). Não encontrei exatamente quais foram as frases e/ou parágrafos plagliados. No livro de Javier Marías ele cita uma porção deles, mas eu não tenho paciência para procurá-las. Na internet achei várias menções a outras acusações de plágio entre autores espanhóis (inclusive com o nobelizado Camilo José Cela). Tudo muito ligeiro e irrelevante. Vamos seguir em frente e esquecer de vez este sujeito (mas não Veneza e o quadro de Giorgone, belíssimos). [início 05/11/2009 - fim 07/11/2009]
"A tempestade", Juan Manuel de Prada, tradução de Luiz A. de Araújo, editora Best Seller (1a. edição) 2003, brochura 13,5x21, 320 págs., ISBN: 85-7123-870-7
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