Se eram os diálogos e a experimentação com a forma que chamavam a atenção em "Finalmente hoje", o livro anterior de Marcio Renato do Santos, o que encontramos em "Outras dezessete noites", seu livro mais recente, é a força do instantâneo, do registro quase fotográfico de uma cena banal, costumeira, exemplarmente humana. É notável sua capacidade de capturar em pequenos registros a potência de certos fenômenos urbanos, do inusitado de muitos comportamentos socialmente aceitos, de chamar nossa atenção para as epifanias do cotidiano. O olho do narrador perscruta personagens, tira deles os pensamentos mais entranhados e fugidios. Marcio Renato não exatamente faz seus personagens produzirem um fluxo contínuo de consciência, mas o leitor, a cada conto, parece estar em ambientes onde uma miríade de vozes particulares ecoam, mas apenas umas poucas são inteligíveis e acabam fazendo sentido, para logo serem substituídas por outro conjunto delas, igualmente brutais e interessantes. Os personagens estão sempre prestes a tomar uma decisão, ou parecem que irão postergar ainda um tanto mais decisões que já deveriam ter tomado. Ao leitor, voyeur da misérias humanas, cabe uma surpresa a cada história, a cada noite. Há uma discreta conexão entre os contos, transições sutis, como aquelas que intuímos ao vermos de longe uns escolhos de um mesmo rochedo que afloram d'água, próximo a costa ou mesmo em alto mar. Acho que já falei o quanto os contos do Marcio Renato me lembram as cousas do Raymond Carver. Vamos ver para onde esse curitibano inquieto nos levará.
[início: 16/03/2017 - fim: 17/03/2017]
"Outras dezessete noites", Marcio Renato dos Santos, Curitiba-PR: editora Tulipas Negras, 1a. edição (2017), brochura 14x21 cm., 124 págs., ISBN: 978-85-917171-4-9
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