Publicado originalmente em 1941, "La mujer de Martin Guerre" é um romance histórico, não de sucessos icônicos, transformadores ou chaves da história da humanidade, mas inspirado num processo judicial bizarro que aconteceu no interior da França, em meados do século XVI. A história é mesmo curiosa, sendo que esse livro de Janet Lewis é apenas uma de suas muitas versões ficcionais, tanto literárias (de Alexandre Dumas, Honore de Balzac e Javier Marías, para apenas citar três) quanto cinematográficas. O texto original que inspirou esses autores foi publicado em 1561 por Jean de Coras, juiz da região de Toulouse, na Occitânia francesa. Duas das famílias que dominavam economicamente um vale afastado das rotas importantes dos Pirineus franceses resolvem uma antiga contenda fazendo casarem-se seus dois jovens herdeiros, nem pré-adolescentes ainda, Martin e Bertrande, crianças de pouco mais de onze anos. Quando completam quatorze as crianças consumam seu casamento e passam a morar juntas na propriedade dos pais de Martin, em Artigue, mas só oito anos depois deles nasce um filho, Sanxi. Logo depois, por conta de uma desavença com seu pai, Martin resolve viajar até um vilarejo próximo para comprar sementes e promete a mulher retornar em uma semana, mas isto não acontece. Ele fica ausente por quase oito anos e é tido como morto, mas retorna, alquebrado e envelhecido, a seu vilarejo, reclamando seus direitos, como pai, marido e senhor das terras de seus pais, já mortos. Apesar de um estranhamento inicial Bertrande o aceita como seu desaparecido marido, retoma a rotina dos negócios da família e chega a ter uma filha com ele, pouco mais de um ano depois. Todavia esse revivido Martin é acusado por um tio de Bertrande de ser um impostor e é levado a julgamento, primeiro em Riex e logo, numa complexa apelação, em Tolouse. E nada mais conto da trama. O livro de Lewis é curto, escrito em uma linguagem direta, objetiva, restrita a fatos, como num relatório ou peça judicial, mas é rica em insinuações, provocações e reviravolta narrativas, digressões e reflexões sobre preceitos morais e éticos. O leitor acompanha como num transe o processo de investigação da identidade de Martin e os interesses cruzados no caso (que não apenas são econômicos, mas também religiosos, pois na época em que se passa a historia a França está dividida entre a fé católica e os prosélitos do protestantismo, lá e naquela época conhecidos por Huguenotes). É um livro que se deixa ler com genuíno prazer, interessante mesmo. É sim um digno volume da editora Reino de Redonda, invenção genial de Javier Marías. Vale!
Registro #1261 (romance #333)
[início: 08/03/2018 - fim: 11/03/2018]
Registro #1261 (romance #333)
[início: 08/03/2018 - fim: 11/03/2018]
"La mujer de Martin Guerre", Janet Lewis,
tradução de Antonio Iriarte, prólogo de Manuel Rodríguez Rivero, Madrid:
Reino de Redonda (1a. edição) 2016, capa-dura 14,5x23 cm., 180 págs.,
ISBN: 978-84-936887-8-3 [edição original: The Wife of Martin Guerre (San Francisco: Colt Press) 1941]
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