As 38 deliciosas crônicas reunidas neste "Aguafuertes porteñas" foram produzidas há muito tempo, mas têm o frescor das cousas poderosas que só autores fortes sabem engendrar. Roberto Arlt nasceu no último ano do século XIX, na Argentina, filho de imigrantes europeus pobres de origem alemã: pai prussiano e mãe austro-húngara. É considerado hoje um dos primeiros autores modernos da Argentina, precursor e mestre de sujeitos igualmente seminais de seu país natal, como Julio Cortázar, Ricardo Piglia, Roberto Bolaño e César Aira. Estas crônicas foram produzidas entre 1928 e 1933. Os temas são variados, tratam do cotidiano e de questões filológicas, com um sentido de humor muito especial. Se por vezes flerta com a sociologia selvagem, de quem parece açodado por entender seu tempo e circunstâncias, sabe deixar ao leitor a continuidade das reflexões sobre questões sociais complexas, das relações entre homens e mulheres, das diferenças entre os cidadãos de seu tempo. Ele sempre está em um café, num restaurante, num transporte público; ouve as histórias das gentes; descreve os tipos raros que encontra; explora a riqueza dos jogos verbais que percebe ou recolhe; antecipa a psicologia freudiana - ao tentar entender as motivações dos leitores e seres bizarros que encontra; vai ao cinema, digressa sobre a política e o tormento das mudanças constitucionais; ironiza sem dó os políticos profissionais; discute as "cartas ao leitor" que recebe na redação do diário El Mundo. Como todo bom cronista, de cidades que tem a fortuna de receber de tempos em tempos bons cronistas, Arlt sabe ser sarcástico e até cruel, mas nunca hipócrita ou falso, nunca preso a escravidão mental de ideologias ou modismos bobos. Em alguma das crônicas ele diz: "(...) doña X, se pasa la vida estudiando la vida del prójimo. Y la estudia com apasionamiento incosciente en todos los detalles exteriores que permitem hacer deducciones profundas, y llega un momento en que ve con más claridad en las vidas de los otros que en la propria". É esse risco que todo cronista corre, quando pretende registrar uma impressão de algo fugidiu que recolhe nas ruas. Que belo livro. Segue o baile. Vale!
Registro #1498 (crônicas #268) [início: 12/11/2019 - fim: 04/01/2020]
"Aguafuertes porteñas", Roberto Art, Ciudad Autónoma de Buenos Aires: EDICOL - Editorial Cooperativa de Libreros, 1a. edição (2014), brochura 13x20 cm., 136 págs., ISBN:
978-987-1263-15-8
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