Na mitologia grega, Erínias eram as forças primitivas que personificavam vingança, reclamavam com rancor, implacavelmente, o sangue daqueles que cometeram crimes. Em "Ao pó", Morgana Kretzmann apresenta, logo nas primeiras páginas de seu romance de estreia, um crime. Ao longo de sua narrativa, acompanhamos os desdobramentos desse crime na vida de um grupo familiar, em uma cidade do interior do Rio Grande do Sul, no final do século passado. Sofia ainda é adolescente quando percebe que a licenciosidade e cupidez de seu tio, outrora dirigidas a ela, desloca-se para sua irmã mais nova, Alice. Sendo jovem, Sofia não alcança saber como suportar esta situação. Ela foge, se radica no Rio de Janeiro e torna-se, em pouco mais de dez anos, uma atriz respeitada. Todavia, a ambição e arrivismo que a fizeram destacar-se na cena teatral carioca, antes de denotar força mental e auto controle apenas mascaram o desejo de vingar-se do tio. Para meu juízo, de leitor, o verdadeiro drama de Sofia é não ter a vocação certa para ser uma Erínia eficiente (e isto diria também um analista perverso). A história é bem contada, em capítulos curtos que se alternam com o que se pode imaginar serem sonhos ou pesadelos da protagonista, manifestações de seus mecanismos mentais de sublimação, cada vez menos satisfatórios, pois sua vida segue uma espiral de problemas, conflitos e mágoas. Trata-se de um romance curto, de forte carga emocional, que deixa-se ler em poucas horas. Bom livro. Vamos a ver o que essa curiosa autora nos oferecerá no futuro. Vale!
Registro #1504 (romance #375) [início - fim: 16/03/2020]
"Ao pó", Morgana Kretzmann, São Paulo: Editora Patuá, 1a. edição (2020), brochura 14x21 cm., 164 págs., ISBN:
978-85-8297-893-1
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