sábado, 9 de dezembro de 2017

free women, free men

Comprei esse livro ainda em abril, mas os serviços alfandegários brasileiros, ineficientes e canalhas como sabem ser, me fizeram recebê-lo apenas em julho. Em "Free Women, Free Men" encontramos 36 ensaios robustos, onde Camille Paglia apresenta sua visão bastante particular e provocadora sobre feminismo, sexo e gênero. Mais precisamente, encontramos no livro os três primeiros capítulos de seu livro mais contundente, "Personas Sexuais", de 1990; três transcrições de palestras ou conferências acadêmicas; três resenhas literárias; cinco transcrições de entrevistas; vinte e dois ensaios independentes, publicados originalmente em revistas e jornais americanos e ingleses. O conjunto também pode ser dividido cronologicamente, em dois grandes blocos: dezenove são textos relativamente antigos, dos anos 1990, associados a repercussão de "Personas Sexuais", e quatorze mais recentes, dos anos 2010. O leitor não precisa ler os ensaios do livro sequencialmente, na ordem em que foram editados. Há uma natural repetição de temas e informações, mas isso não chega a aborrecer o leitor. É inegável que cada um deles se defende sozinho e oferece um festival de associações ("Personas Sexuais" é imbatível, qualquer pessoa honesta intelectualmente que trabalhe com esses assuntos não pode furtar-se de lê-lo). Alguns ensaios são panfletos marcadamente políticos, mais agressivos, incisivos, categóricos; em outros o tom é mais professoral, acadêmico, frio, mas sem condescendência. Há vários ensaios em que Camille defende seus argumentos sobre política sexual, mídia e o papel das universidades como foro de discussão; noutros encontramos abordagens acadêmicas sobre a história do feminismo, estética, cultura pop, a história das lutas pelas liberdades civis nos Estados Unidos. No fundo seu tema principal não é exatamente o feminismo, a luta por igualdade de gênero, mas sim a cultura, a evolução da cultura como núcleo central de coesão entre seres humanos de diferentes lugares do planeta, origens étnicas e gêneros. É interessante como ela antecipa, nos artigos dos anos 1990, a ascensão de uma geração de acadêmicos dedicados aos temas de feminismo e gênero que não alcançaram uma formação adequada, fatalmente contaminados por retóricas foucaultianas, lacanianas, desconstrutivistas e marxistas. Segundo ela, sem perspectiva histórica, literária, antropológica e sem incorporar a realidade das diferenças biológicas entre homens e mulheres, qualquer debate ou pauta feminista está condenada ao fracasso, a discussão circular, estéril. Anotei uma miríade de argumentos e passagens divertidas, certamente polêmicas e explosivas, mas prefiro citar apenas duas, uma das antigas e outra bem recente: " What I represent is the essence of the Sixties, which is free thought and free speech. And a lot of people don't like it. A lot of people who are well-meaning on both sides of the political spectrum want to shut down free speech. And my mission is to be absolutely as painful as possible in every situation." (de uma palestra proferida no MIT, Massasshussets Institute of Technology, em 1991, num debate sobre a crise das universidades americanas) e "It is difficult to understand how a generation raised on the slapdash jumpiness of Twitter and texting will ever develop a logical, coherent, distinctive voice in writing and argumentation, And without strong books and essays as a permanent repository for new ideas, modern movements eventually sputter out for lack of continuity and rationale. Hasty, blathering blogging (without taking time for reflection and revision) is also degrading the general quality of prose writing." (de uma entrevista publicada em uma revista britânica, em 2014). Bom divertimento. Vale!
Registro #1246 (crônicas e ensaios #222)
[início: 12/08/2017 - fim: 07/11/2017]
"Free Women, Free Men: Sex, Gender, Feminism", Camille Paglia, New York: Pantheon Books / Penguin Random House, 1a. edição (2017), capa-dura 14,5x21,5 cm., 319 págs., ISBN: 978-0-375-42477-9

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