Escrito em uma linguagem direta, sem afetações e até bem humorada, esse pequeno livro pode ser utilizado por estudantes e jovens leitores para alcançarem uma visão panorâmica da literatura. Obviamente não é possível que o leitor encontre nele digressões aprofundadas sobre cada um dos temas, tendências ou autores que se espalham em mais de três mil anos de história literária, dos mitos e lendas transmitidas oralmente por nossos antepassados até a miríade de textos disponíveis hoje, acumulados digitalmente. John Sutherland é um especialista renomado, autor de livros acadêmicos em que faz crítica literária e biográfica (sobretudo de autores do período vitoriano). É professor emérito da Universidade de Londres (University College London, to be precise). Um leitor mais exigente reclamará do quão ligeiros são os comentários dedicados a seu autor favorito; pedagogos não irão gostar do esquematismo da proposta, da associação direta entre grandes impérios, grandes civilizações e alta literatura; especialistas em literaturas de línguas não inglesas rechaçarão com veemência a ausência de seus cânones; feministas, grupos étnicos ou autores filiados a algum dos infinitos nichos literários deste nosso século XXI sentir-se-ão no mínimo ofendidos. Entretanto nem tudo é literatura de língua inglesa no livro de Sutherland; Jane Austen só é citada menos vezes que Dickens; há um bocado de informação sobre literatura pós-colonial, realismo mágico latino-americano, autores orientais; e ele fala um bocado sobre a ausência de fronteiras literárias no mundo contemporâneo. Mas o que pode ser dito de um assunto tão vasto em um livro de apenas 300 páginas? O que realmente dá estofo ao livro é a qualidade da prosa de Sutherland. Ele deve/devia ser um notável professor, com capacidade de síntese e a rara habilidade de buscar em detalhes que parecem irrelevantes a exemplificação de conceito bastante complexos. Os quarenta capítulos são basicamente independentes, uma rápida consulta ao índice pode levar o leitor a um assunto específico. A maioria deles não trata de um autor em particular, mas sim de um tema, cronologicamente definido. Sutherland também enfatiza as transições dos hábitos de leitura; fala sobre o objeto livro, que nunca poderá ser melhorado, como já nos ensinou Umberto Eco; sobre aquilo que poderíamos ler em um mundo onde a oferta de títulos é, convenhamos, infinita. Trata-se de um sujeito otimista, que acredita no poder das ferramentas tecnológicas contemporâneas de recuperar algo dos primórdios da aventura humana, quando a literatura era uma coisa falada, contada ao redor de um fogo. Para ele essas tecnologias possibilitarão mais diálogo comunitário, a construção de novas narrativas globais, que darão conta do assombro que todos nós, homo sapiens, experimentamos desde as cavernas, por mais cínicos que aprendemos a ser. No site de sua editora (a Yale University Press), encontrei Sutherland a falar de seu livro num curto teaser: clica! Vale a pena conferir. Bom divertimento.
Registro #1244 (crônicas e ensaios #220
[início: 12/11/2017 - fim: 17/11/2017]Registro #1244 (crônicas e ensaios #220
"Uma breve história da literatura", John Sutherland, tradução de Rodrigo Breunig, Porto Alegre: editora LP&M, 1a. edição (2017), brochura 14x21 cm., 311 págs., ISBN:
978-85-254-3660-3 [edição original: A Little History of Literature (New Haven/Connecticut: Yale University Press) 2013]
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