"El crimen del conde Neville" é mais um dos curtos e potentes romances de Amèlie Nothomb, daqueles que mais parecem contos de fadas revisitados, atualizados à nossa contemporaneidade. Desta vez ela faz uma releitura de um conto de Oscar Wilde: "O crime do lorde Arthur Savile". Sérieuse, a filha adolescente de Henri Neville, um conde belga arruinado, é encontrada em um bosque por uma vidente. Assim como na história de Wilde, a vidente, ao entregar a menina de volta ao pai, vaticina que o conde matará um de seus convidados durante uma festa, a última das famosas "Garden Parties", que ele oferece anualmente. Atormentado pela profecia, Neville vive freneticamente os dias que antecedem a recepção. O leitor acompanha - em capítulos curtos - sua história de sua vida e as histórias de sua mulher, Alexandra e seus dois outros filhos, Oreste e Éléctra, irmãos mais velhos de Sérieuse. O leitor que conhece a história do lorde Savile de Oscar Wilde sabe como deve terminar a história do conde Neville, que lê-se com prazer em um par de horas. Todavia, o desenrolar detetivesco da narrativa é algo secundário. Nothomb oferece ao leitor reflexões ácidas sobre a vida em sociedade, sobre a hipocrisia, vaidade e soberba, sobre ambição e destino. O alvo destas reflexões é a nobreza belga e suas convenções ultrapassadas, bem como a sociedade belga, enredada em mentiras, condenada à decrepitude. Entretanto, neste nosso mundo contemporâneo, em que as redes sociais multiplicam a potência dos desejos de todos, são milhões aqueles que vivem de aparências, em perpétuo autoengano, em dissimulações e contínua fuga da realidade. A história brinca com os efeitos do poder da sugestão, do engodo, ou melhor, o poder que alguns têm de dominar as vontades e atos dos outros, e das consequências quase sempre funestas desta submissão. Nothomb usa também arquétipos clássicos para ilustrar sua narrativa, referências emprestadas da história dos Átridas (Ifigênia, Orestes, Electra), de Sófocles (Antígona) e bíblicas (Isaac e Abraão). Bela fábula moral, adequada a estes dias tão sombrios. É sempre bom retornar ao mundo mágico desta curiosa escritora. Vale!
Registro #1428 (romance #380)
[início - fim: 27/04/2020]
"El crimen del conde Neville", Amèlie Nothomb, tradução de Sergi Pàmies, Barcelona: editorial Anagrama (Panorama de Narrativas #954), 1a. edição (2017), brochura 14x22 cm., 113 págs., ISBN: 978-84-339-7986-5 [edição original: Le crime du comte Neville (Paris: éditions Gallimard) 2015]
Registro #1428 (romance #380)
[início - fim: 27/04/2020]
"El crimen del conde Neville", Amèlie Nothomb, tradução de Sergi Pàmies, Barcelona: editorial Anagrama (Panorama de Narrativas #954), 1a. edição (2017), brochura 14x22 cm., 113 págs., ISBN: 978-84-339-7986-5 [edição original: Le crime du comte Neville (Paris: éditions Gallimard) 2015]
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