Nunca havia lido nada de Noemi Jaffe. Gostei de alguns comentários dela no bom podcast "De modo geral" e resolvi experimentar. Esse volume, "Não está mais aqui quem falou", foi publicado em 2017. São quarenta contos ou crônicas curtas quase todas, narrativas curtíssimas, verdadeiros aforismos. Alguns trechos das histórias parecem terem sido capturados de um fluxo, partes de um discurso que começou antes e talvez continue em outro lugar, mas resta ali grafado na forma como o leitor encontra. Os temas são muito variados e há um jogo, que flerta com a dúvida, com a verossimilhança, com a verdade última das coisas (brincando com a ideia de verdade e não verdade). Em algum momento parece que Jaffe tenta emular o Flaubert de Bouvard e Pécuchet, em textos de uma curiosidade esdrúxula (como ela mesma define em algum lugar), associações selvagens (que escondem uma cultura vasta), propostas de jogos verbais, catálogo de palavras. Lembrei coisas que li da Lydia Davis, do David Sedaris, da Patti Smith, do Sam Sheppard e do Caetano Galindo (cada um parecendo espoucar em um texto ou outro). Há histórias etimológicas, sobre a origem das palavras, dos lugares comuns, das frases feitas, das mutações dos conceitos e ideias, espantos com histórias das línguas e da tradução. Outras são releituras de mitos, de passagens bíblicas. Gostei muito de uma história sobre Rubem Braga, outra sobre Primo Levi, outra ainda sobre Manuel Bandeira e Beckett, as reflexões sobre a velhice, beleza, hospitalidade, solidariedade. Ojo!, é o caso de procurar mais coisas desta notável escritora. Vale!
Registro #1545 (contos #178) [início: 08/06/2020 - fim: 10/06/2020]
"Não está mais aqui quem falou", Noemi Jaffe, São Paulo: editora Schwarcz (Companhia das Letras / Penguin Random House), 1a. edição (2017), brochura 14x21 cm., 144 págs., ISBN: 978-85-359-2948-5
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