Nos romances de Amélie Nothomb, sempre curtos, não há espaço para digressões supérfluas, portanto ela é invariavelmente direta, cortante, objetiva (mas também muito cruel, convenhamos.) Este romance é irritante do começo ao fim mas o leitor se deixa conduzir pela história e pela autora. Foi irritante para mim pois ela conseguiu fazer com que eu tivesse ganas de entrar na história e resolver tudo do meu jeito, tomar uma atitude guinesca contra o humor negro, o tédio, a vergonha, a inação e o sarcasmo dos personagens. Inevitável dizer que me surpreende muito a forma utilizada por ela para fisgar o leitor. Não há tempo para o sujeito inventar atalhos na leitura: ou é do jeito dela, com as imagens dela ou abandonas logo o romance. Terminado o livro entendo melhor o que está em jogo. Ela mostrou a que veio. O enredo é mesmo irrelevante: um casal de meia idade se muda para o campo e passa a ser progressivamente importunado por um vizinho bizarro. A incapacidade do ser humano de ser leal a si mesmo (em nome das convenções, da boa educação, da tradição) fica patente nesta história. O que no início é anacrônico no fim demonstra como podemos ser importunados (até mesmo por um livro afinal) à exaustão. Diferentemente das crianças (presentes em idéia no livro, apesar de haver poucas personagens jovens no texto) nós mais velhos dificilmente seguimos nossa intuição, nosso lado mais animal, selvagem, e aceitamos quase tudo sem reclamar. Para isto crescemos afinal. Não conheço muito a cultura francesa, mas até onde entendi o formalismo e a frieza nas relações francesas explicam muito o livro. Ao fim entendemos como inevitavelmente nos transformamos pelas ações (tanto nossas quanto dos outros). Se é para se resumir o livro em uma frase eu diria que o autoconhecimento é a única coisa honesta que um homem pode fazer a si mesmo. Notável escritora esta francesinha.
"As catilinárias”, Amélie Nothomb , tradução de Ari Roitman e Paulina Wacht, editora Record, 1a.edição (1997), brochura 14x21cm, 144 págs. ISBN: 85-01-04914-X
"As catilinárias”, Amélie Nothomb , tradução de Ari Roitman e Paulina Wacht, editora Record, 1a.edição (1997), brochura 14x21cm, 144 págs. ISBN: 85-01-04914-X
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