Você percebe que o bom poeta que lê há 150 páginas realmente é dos grandes quando encontra um "SEM PACTO // "I make a pact with you, Walt Whitman" // Erza Pound // 'poeta que se diluiu / dá cria: / diluidores mil // e cda / deu mole / dilui-se / cedeu // com drummond não tem pacto: / carrego comigo / só / sua pedra impacto // pra jogar na moleira / versiprosa brasil / que ele mesmo / pariu'. Frederico Barbosa reuniu em "Na lata" toda sua produção poética de 1978 a 2013, 35 anos de poesias. São pelo menos oito outros livros que desaguaram nesse: Rarefato (Iluminuras, 1990); Nada Feito Nada (Perspectiva, 1993); Contracorrente (Iluminuras, 1993); Louco no Oco sem Beiras (Ateliê editorial, 2001); Cantas de Amor entre os Escombros (Landy editora, 2002); Brasibraseiro (Landy editora, 2004); A Consciência do Zero (editora Lamparina, 2004) e Signicidade (Dulcineia Catadora, 2009). Mas há outros poemas que não vieram de livros, mas sim de jornais, de revistas, de sites, de blogs, das efêmeras e turbulentas redes sociais (ou seja, nenhum poema perdeu-se da arca desse Noé criador de "already mades", como grafou Kenneth David Jackson na contracapa). Pois sim, Frederico Barbosa fez retoques ou revisou completamente muitos deles, misturou-os todos, organizou-os não cronologicamente ou compartimentados em suas prévias encarnações, mas sim num livro onde todos eles ficam juntos, redistribuídos em nove conjuntos, nove temas, talvez inventados quando da edição do "Na lata", talvez já engendrados quando da criação deles. Um dos objetivos confessos do livros é explorar o conceito de palavra-impacto (a poesia como composição construtora de efeitos). Não sei se entendi corretamente, mas acho que o leitor encontra impacto suficiente no livro para esse conceito merecer crédito. Os nove conjuntos de poemas se oferecem ao leitor como se fossem novos, inéditos (e são mesmo, se um sujeito leitor não os conhecia antes). As propostas tem vocação distinta: ora se fala da literatura, da tradição poética, dos precursores de um efebo; ora é a geografia da história pessoal do poeta que transborda dos poemas; ora vaza o engajamento de um sujeito vive seu tempo (nec metu); ou são palavras de um sedutor, de um apaixonado, de alguém que usa os sentidos do corpo ao enfeitiçar (e ser enfeitiçado) pela Musa. Gostei muito de um efeito que Frederico usa em vários poemas, o de fragmentar as palavras para que o poema se encaixe numa determinada forma. Gostei particularmente das séries "Sobre Si", "De Ocasião" e "Lírica Paralela"; das séries de poemas mais longos (ou conjuntos temáticos de poemas enfeixados num título); das citações literárias (o descobrimento do Ulysses, de James Joyce, em seu "Certa biblioteca pessoal 1978" é algo que me fez viajar feliz pela memória dos dias de São Bernardo do Campo) e especialmente de "Um poema para si" (cuja reprodução encontrei num blog). Bueno. Livros de poemas não se esgotam numa leitura, nem em duas, nem em muitas, por isso é bom saber que esse "Na lata" estará nos meus guardados, ao alcance da mão, para ser folheado num outro dia, numa outra primavera, num outro verão. Vale.
[início: 16/06/2014 - fim: 11/04/2015]
"Na lata: poesia reunida 1978-2013", Frederico Barbosa, São Paulo: editora Iluminuras, 1a. edição (2013), brochura 14x21 cm., 368 págs., ISBN: 978-85-7321-407-9
Nenhum comentário:
Postar um comentário