Aborrecido em uma fila de supermercado eis que vejo em exposição esse livrinho, produzido para ser distribuído e vendido em bancas de jornal. Lembrei de quando li as aventuras de Tartarin de Tarascon pela primeira vez, numa edição já surrada que encontrei na boa e velha biblioteca pública de São Bernardo do Campo, que já havia retornado dos campos do esquecimento quando li a versão do Neil Gaiman dos mitos nórdicos, recentemente registrada aqui. Essa versão do grande livro de Alphonse Daudet, que foi publicado originalmente em 1872, é em quadrinhos e faz parte de uma coleção de clássicos ilustrados. Tartarin é um sujeito falastrão, que conta prodígios que nunca vivenciou. É uma espécie de fusão entre Don Quijote e Sancho Panza, mas sem a nobreza confusa do primeiro ou a capacidade de autocrítica do segundo. Pressionado por seus concidadãos em Tarascon, cidade da Provença francesa, ele parte para a Argélia para caçar leões e confirmar sua fama. Tendo mais sorte que juízo (como se diz aqui pelo sul do Rio Grande do Sul) mesmo experimentando infortúnios sem conta ele acaba voltando para casa, com a pele de um leão cego, que abateu por acaso, e também com uma dromedário apaixonada. Daudet alcança descrever com humor o que há de mais ridículo na condição humana. Tartarin é um personagem trágico, patético, que lamenta sua própria desgraça e tem consciência que foi o artífice das ilusões que perdeu, enfim, trata-se de um homem ridículo, como quase todos os homens são, que só consegue sobreviver e suportar as vicissitudes da vida sempre e progressivamente mentindo para si próprio, mentindo muito mais do que mentirá ou enganará os demais. Ulalá. Talvez seja a hora de reler o texto de Daudet. Cousa boa.
Registro #1219 (hq's cartuns e mangás #64)
[início - fim: 05/04/2017]Registro #1219 (hq's cartuns e mangás #64)
"Tartarin de Tarascon", Alphonse Daudet, tradução de Caroline Chang, adaptação, roteiro e desenhos de Pierre Guilmard, colorização de Louisa Djouadi, Levallois-Perret / France: Hachette Filipacchi Médias / Del Prado do Brasil (Grandes clássicos da literatura em quadrinhos, vol. 22), 1a. edição (2014), capa dura 19,5x26,5 cm., 60 págs., sem ISBN [edição original: (Levallois-Perret/France: Editions Adonis) 2010; Aventures prodigieuses de Tartarin de Tarascon 1872]
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