Há pouco mais de um ano, num funesto 08 de junho, uma sexta-feira, Anthony Bourdain cometeu suicídio. Senti aquela morte como a de uma pessoa querida, como se fosse uma pessoa muito próxima. Lembro-me muito bem do impacto da leitura de seu primeiro livro, "Cozinha confidencial", no início dos anos 2000. Não se tratava apenas de um livro sobre gastronomia, salpicado com receitas bacanas. Bourdain descrevia o ofício de cozinhar nos grandes restaurantes com humor e sarcasmo, contrastando o visível glamour daquela atividade com o pouco conhecido estresse ao qual os profissionais são submetidos, com os truques sujos dos proprietários para promover vendas, com o ego inflado dos cozinheiros estrelados, com as carreiras que se eclipsavam por conta das drogas. Depois li vários outros livros dele (Maus bocados, Ao ponto), seus textos de ficção (Bobby Gold) e suas graphic novels (Get Jiro! e Hungry Ghosts). O sucesso com a venda dos livros o levou a televisão, onde gravou várias séries, séries admiráveis que nunca cansam o espectador (A Cook's Tour, No Reservations, The Layover e Parts Unknown). Bourdain tornou-se uma celebridade, um talentoso contador de histórias, um sociólogo amador, alguém que tinha a notável capacidade de sintetizar em poucos minutos os complexos contextos de culturas bastante diferentes da sua. Poucas pessoas inspiravam tamanha admiração e também, claro, inveja. Assim como eu, que ao fazer minha peregrinação à Dublin preparei-me assistindo seus shows gravados lá (um deles pode ser acessado aqui: No reservations), muitos devem ter se inspirado nele ao programarem-se para uma viagem. Sua morte pegou todos de surpresa. Como podia um sujeito vivendo uma vida tão prazerosa cometer suicídio, todos perguntavam-se. Logo após sua morte o canal de notícias CNN abriu espaço em suas mídias sociais onde os fãs de Bourdain poderiam registrar algo sobre ele, celebrar seus feitos, falar de sua influência. Recentemente parte daqueles registros digitais nas mídias sociais foram transferidos para o formato livro, este "Anthony Bourdain Remembered". Trata-se de 155 registros, que guardam algo do impacto daquela notícia triste. Alguns são de celebridades, colegas chefs, gente da televisão ou políticos bastante conhecidos; a grande maioria pessoas comuns, entusiastas de sua arte, aficionados do mundo inteiro. O livro contém fotos muito bacanas, fotos que capturam aquele olhar ambíguo, de quem fazia as coisas parecerem fáceis, mesmo quando elas eram sabidamente difíceis. Grande sujeito, para ser lembrado sempre. Bela homenagem, belo livro. Vale!
Registro #1447 (perfis e memórias #92) [início - fim: 29/07/2019]
"Anthony Bourdain Remembered", Amy Entelis (organizadora), New York: HarperCollins Publishers (Ecco hardcover books),
1a. edição (2019), capa-dura 22,5x26 cm., 208 págs., ISBN:
978-0-06-295658-3 [edição original: CNN Worldwide 2019]
Um comentário:
Também admirava Bourdain na tevê, lembro quando comeu feijoada no Rio de Janeiro. Também surpreso com o suicídio dele na época.
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