Este é um daqueles livros que comprei na época do lançamento, deixei para ler mais tarde e esqueci completamente. Só recentemente, ao ler "Nemesis", descobri que "Homem comum" é a primeira de um ciclo de quatro novelas de Philip Roth dedicadas a descrever aspectos do impacto da morte sobre os homens. "Homem comum" (Everyman, no original) é uma história curta, que se lê com animação e prazer (em que pese o terrível do tema). A economia formal do livro é mesmo rara. Acompanhamos rapidamente a vida pessoal atribulada, o sucesso profissional como publicitário e as reiteradas doenças de um sujeito. O livro começa com ele descrevendo seu funeral. Ele faz o censo dos presentes, tenta fixar o estado de espírito de cada um: seu irmão mais velho, duas das mulheres com quem se casou, seus filhos (os que o detestam e uma que o ama), um ou outro amigo. Este início lembra um tanto o filme "Sunset Boulevard", onde um corpo morto flutuando em uma piscina começa a contar a história de como acabou chegando até ali (lembra também o "Memórias póstumas de Brás Cubas", claro, mas o livro de Machado de Assis é linear nas reminiscências, enquanto que o personagem de Roth embaralha as suas). Ele recorda, em cenas curtas, fragmentárias, os sucessos e fracassos de sua vida: seus casamentos, as desavenças com os filhos mais velhos, suas mentiras, a inveja do irmão, suas aventuras sexuais. Há algo de monôtono nas reiteradas explicações sobre os procedimentos cirúrgicos pelos quais o personagem principal passa, mas me parece que esta saturação é proposital. Roth parece nos lembrar que os aborrecimentos pelos quais os doentes crônicos passam são mesmo infindáveis e sempre originais. Gostei particularmente de uma passagem onde este personagem principal conversa com um coveiro (pensar em Hamlet e a caveira de Yorick é uma associação óbvia). A decadência e as provações pelas quais o personagem passa são visíveis, palpáveis, inevitáveis. Este bom livro provoca reflexões potentes. A morte é mesmo um detalhe besta. [início 07/06/2011 - fim 14/06/2011]
"Homem Comum", Philip Roth, tradução de Paulo Henriques Britto, São Paulo: Companhia das Letras, 1a. edição (2007), brochura 14x21 cm, 131 págs. ISBN: 978-85-359-1087-2 [edição original: Everyman (Houghton Mifflin) New York, 2006]
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