De Arturo Pérez-Reverte já li vários romances e novelas, principalmente aquelas do ciclo dedicado às aventuras do industrioso Capitão Alatriste. O sujeito tem uma imaginação dos diabos e sabe contar histórias. Mas esse "Los barcos se pierden en tierra" é material com outra vocação, outros propósitos. Trata-se de noventa e cinco artigos publicados em jornal, no XL Semanal, em sua coluna "Patente de corso". Dentre o milhar de artigos que já publicou, desde o início dos anos 1990, Pérez-Reverte fez uma seleção daqueles dedicados aos assuntos do mar, sua grande e confessada paixão. Para aqueles que compartilham com ele este amor ao mar é mesmo um livro maravilhoso. Ele conta coisas que parecem simples, mas que alcançam um registro realmente perene e universal (e que as fazem merecer uma versão em livro, poupando-as do funesto destino daquilo que só é publicado em jornal). Pérez-Reverte conta suas memórias de infância, da leitura dos clássicos de marinharia (Stevenson, Sabatini, Defoe, Conrad e Melville) e histórias em quadrinhos (Tintin sobretudo, mas também das histórias como as de Ivanhoé, de Júlio Verne, da guerra de Tróia, de Ulysses); fala dos velhos marinheiros que o adestraram nas lides do mar; descreve as façanhas e os desastres da história naval de seu país; fala de crimes ecológicos, vazamentos de petróleo, pesca predatória, da falta de educação dos proprietários de barcos; relembra piratas, corsários e bucaneiros; brinca com as diferenças entre espanhóis e ingleses nos assuntos do mar; lembra do quão gigantesco e indomável é o mar, apesar dos homens estarem sempre a confrontá-lo, tolos que são. Mas não há só nostalgia nessas histórias. Ele fala também - com sarcasmo, claro - dos assuntos do dia a dia de seu país (é sempre incrível como certos escritores antecipam - como profetas malditos - os desastres individuais e coletivos de uma sociedade). Há tanto encantamento neste livro que quase tudo parece ter sido escrito mesmo em alto mar, inspirado pela água salgada e pela luz das estrelas. Quase todos artigos têm o mesmo tamanho fixo pela coluna do jornal e são francamente factuais (na medida do possível). Todavia encontramos algumas histórias onde há uma pitada de invenção, como se fossem escolhos de romances pouco ambiciosos que se perderam. Só três histórias são realmente longas (e são mesmo as melhores). Uma é dedicada ao sacrifício inútil a que foi obrigado o almirante Pascual Cervera, quando as últimas possessões espanholas no Caribe foram tomadas pelos americanos, no final do século XIX. Outro a um detalhado censo de suas leituras de juventude. E um último dedicado as mágoas de um velho marinheiro que se encontra preso a um porto, sem poder fazer-se ao mar em um dia de chuvas e ondas fortes. Grande corso das letras é esse Pérez-Revete.
[início 06/12/2012 - fim 17/12/2012]
"Los barcos se pierden en tierra: textos y artículos sobre barcos, mares y marinos (1994-2011)", Arturo Pérez-Reverte, Buenos Aires: Aguilar, Altea, Taurus (Alfaguara ediciones),
1a. edição (2012)
brochura
15x24cm, 368 pág. ISBN: 978-987-04-2511-3 [edição original: Alfaguara España, 2011]
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