domingo, 30 de dezembro de 2012

on grief and reason

Esse livro encontrou-me no 12/12/12 e o encantamento provocado pelas idéias de Joseph Brodsky me manteve, até há bem poucos minutos, nesta manhã vagabunda de domingo, penúltimo dia deste 2012, absolutamente "stingless, drowning in honey", imerso em delícias sem fim. "On Grief and Reason" foi publicado em 1995 e reúne 21 ensaios muito bons. Um é de 1978, oito deles são dos anos 1980, doze dos anos 1990. Dois dos ensaios são abertamente nostálgicos. O que abre o livro reúne memórias esparas dos dias de infância e juventude no pós guerra (Brodsky nasceu em São Petesburgo/Leningrado, em 1940). Ele fala de seus primeiros contatos com a lingua inglesa (e com a literatura, cinema e cultura dos não russos), no início da guerra fria. O que encerra é um texto em homenagem a um grande amigo (o poeta e ativista inglês Stephen Spender), escrito uns poucos dias após sua morte. Os demais são ensaios convencionais na forma, transbordantes de erudição, mas escritos também com alguma ironia e bom humor (num inglês que eu não consigo avaliar completamente - menor dos anões que sou - mas que pareceu-me mais que exótico, certamente exuberante, diferente, algo latinizado). Neste conjunto encontramos seu discurso de aceitação do prêmio Nobel (de 1987), assim como textos dirigidos a alunos em cerimônias de formatura (Brodsky foi professor universitário por muitos anos) e aulas magnas de poesia, onde Brodsky discute detalhadamente - linha a linha, palavra a palavra, poemas (de Robert Frost, Rainer Maria Rilke, Thomas Hardy); vários textos longos sobre a experiência de ser poeta, sobre poesia, linguagem, o treinamento desejável à esse ofício e a existência ou não de talento natural (ou de musas inspiradoras); textos políticos - de intervenção política -, nos quais Brodsky reflete sobre o valor intrínsico da liberdade e se contrapõe a opressão. O ensaio que mais gostei é uma espécie de carta, dirigida ao poeta e filósofo Romano Horácio (Quintus Horatius Flaccus). Nele Brodsky explica - ao leitor afinal de contas - as afinidades entre seu estilo e o de Horácio. O texto mais divertido (e cruel) é o de 1978, onde ele conta experiências de uma viagem que fez ao Brasil. Toda vez que eu voltar a encontrar um ufanista delirante, daqueles orgulhosos das singularidades brasileiras, arautos de nossa provável transcendência sobre os demais povos da terra (e como brotam ufanistas assim nestes últimos tempos) lembrarei dos comentários de Brodsky sobre o Rio de Janeiro e sobre o que ele lá viu. Todas as lembranças que tenho de Brodsky são boas. Lembro-me das maravilhas de um outro livro de ensaios seu ("Menos que um", publicado no Brasil em meados dos 1990); de ter encontrado sua casa em Veneza (mas não pude ir a San Michele ver seu túmulo, paciência); de ter conhecido a poesia de Anna Akhmatova, Osip Mandelstam e Marina Tsvetáyeva atráves dele. Enfim, terminar o ano com um livro tão bom foi um presente insuspeitado.
[início 12/12/2012 - fim 30/12/2012] 
"On Grief and Reason: Essays", Joseph Brodsky, Londres: Penguin Books (modern classics), 1a. edição (2011) brochura 13x19,5 cm, 422 págs. ISBN: 978-0-241-95271-9 [edição original: (New York: Farrar Straus Giroux) 1995]
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Balanço final [30.12.2012]
Esse foi um ano de muitas viagens, algumas alegrias e também, claro, uns poucos aborrecimentos. Doña Natália terminou o primeiro ano de psicologia e está animada com o curso; doña Helga defendou o doutoramento, tomou muitos cavas e começou vários projetos novos; o povo de São Paulo segue bem, com o velho timoneiro Aachnald Severinovich no comando. Temos um novo gato. Leon - o Felpudo juntou-se a Salen, Lilica, Nihan e Kyo. Emagreci um pouco, ma non troppo. Revi amigos do IFUSP que não via há quase 30 anos, em um encontro memorável. Em outra oportunidade revi don Marcelo Racy e don Péricles Turnes, amigos dos bons. Marcelo Tápia me fez uma gentileza das grandes, mostrando-me a Casa de Cultura Guilherme de Almeida e me dando a chance de ter nas mãos um legítimo Ulysses de 1927 (uma reimpressão da primeira edição). Dividi uma noite de conversas sobre James Joyce no FestiPOA (capitaneada pelo Fernando Ramos) com o industrioso Caetano Galindo. Conheci as terras altas de Inhotim, em Brumadinho. Flanei com don Renato Cohen pela São Paulo dos Campos de Piratininga. Fiz uma palestra sobre o tempo e o infinito, para um povo das letras da UFSM, que gostei muito de fazer. Roí várias cordas, espantei uns fantasmas, chutei uns traseiros, diminui minha cota de brigas por bobagens, mas fiquei em falta com um punhado de gente, cousas da vida. Organizei as festividades do décimo-nono Bloomsday em Santa Maria. Já no mundo da literatura, terminei a releitura do Proust antes de completar 51 anos como havia planejado; achei vários Javier Marías novos, principalmente suas crônicas e os contos reunidos; li bastante poesia - mais ou menos o dobro do que costumo ler por ano; diminui a média anual de romances policiais, crônicas e ensaios e graphic novels; li mais livros de contos do que usualmente faço; mantive número de romances, novelas e livros com perfis e relatos dentro da média anual; li vários Ian McEwan e vários Joseph Conrad; descobri o quanto John Cheever é bom. Li vários livros de amigos e conhecidos, sempre um terreno incerto, mas não acho que me afastei de produzir registros realmente objetivos afinal de contas. Li as coisas de James Joyce recém publicadas nesse ano por conta de sua obra estar agora em domínio público. Deixei várias destas novidades para reler no ano que vem. Mantive a média de um terço das leituras dedicadas a originais em espanhol, por supuesto. Li apenas quatro livros em inglês, o mais interessante deles o ensaio sobre a obra de Javier Marías assinado por David Herzberger. Ao final foram 105 livros (31 romances; 18 de contos; 11 de poesia; 11 com perfis e relatos; 8 novelas; 3 de histórias em quadrinhos - graphic novels, cartuns ou mangás; 3 romances policiais, 2 infanto-juvenis, 2 catálogos de exposição; 2 peças de teatro; 1 didático; 1 de cartas e 1 breviário). Como sempre quase tudo foi lido com muita alegria. Esse último livro de 2012, "On Grief and Reason" de Joseph Brodsky completei a septingentésima postagem deste blog, 700 registros cronológicos de minhas leituras desde que comecei a contagem, no início de 2007. Sem pressa em três anos alcanço os 1000 registros, antes dos fatídicos Jogos Olímpicos, logo depois dos desastres da Copa do Mundo de Futebol. Cousa boa. Em 2013 quero recomeçar o Nagib Mahfuz; voltar aos clássicos gregos e latinos, à mitologia, certamente que sim; reler algo do Thomas Mann; ler o Tristram Shandy (traduzido pelo Javier Marías); criar mais coragem e enfrentar ao menos um par de russos; treinar mais meu inglês, talvez com Anthony Burgess ou com o Issac Singer; reler o Cervantes. Vamos a ver. São os livros afinal que escolherão me encontrar em 2013. Vale.
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3 comentários:

vera maria disse...

Aguinaldo, tenho muita vergonha de ver sua produção no campo das leituras, mas me perdoo porque já li tanto a trabalho que me dou o direito de ser meio lerda no momento. Mas sempre acompanho seus comentários, esse último crítico que voce comentou me deu arrepios, me senti estudando feito louca pra dar aulas ou fazer projetos ou preparar textos ou... Enfim, você é um leitor voraz, muito interessante porque tem um arco bem abrangente e comenta com muita eficiência suas leituras. Um grande 2013 para você e sua família, incluindo os gatos, e um abraço,
clara

Alexandre Kovacs disse...

Caro Aguinaldo, Espero que os livros continuem nos achando em 2013! Desejo um ótimo ano para você e sua família e parabéns pelo blog!

marcelo sahea disse...

Mais um Brodsky na praça. Maravilha!